Olá, pai.
Mais um natal passa e tu não estás.
Pelo menos, fisicamente.
Peço-te desculpa por não te ter vindo visitar onde o teu corpo, hirto, descansa eternamente.
Contudo, sabes bem que não passa um dia em que tu não estejas comigo.
A cada dia que passa sinto.
Sinto.
Sinto, cada vez mais, saudade.
Saudade.
Saudade pelos bons momentos que não voltam, mas que permanecerão sempre comigo.
Ainda me custa evocar o teu nome no passado.
Falo de ti sempre no presente.
És grande, meu Pai.
Fazes-me falta.
O que eu dava para te dizer as palavras que nunca te direi.
O que eu daria por um abraço.
Enfim, deixando estas lamechices de lado!
Pretendo que, neste natal, os ânimos sejam mais leves.
Para tal, comprei prendas. É como se fosses tu a comprá-las, sabes disso, dadas as circunstâncias.
(…)
Vou-te dizer o que comprei/comprámos os dois.
Para a …, uma caixa de bombons, aqueles do Garoto que tu também costumavas comprar. São óptimos!
Para o …, comprámos um pack de after shave e essas coisas, com cheiro a chocolate. Achei que seria mesmo a cara dele eheh.
Para o nosso menino, comprei um livrinho que é predominantemente sensorial e ilustrativo. Acho que é muito bom, tendo em conta que ele nem um ano tem.
(…)
Para o …, um livro do António Lobo Antunes, uma compilação de crónicas. Gosto bastante da maneira como escreve, acho que ele também irá gostar.
Comprámos também uma tablet de chocolate da milka que tem uns jelly beans, que sonho! Inventam com cada coisa, pai!
Para a mãe, uns after eight “especiais”, os desenhos dos chocolates são diferentes, bonitos, feitos particularmente para esta época. Comprámos também um pack com cremes e essas coisas, sabes que ela gosta disso.
Estas são as minhas/tuas/nossas prendas este ano.
Agora falemos de ti.
Será mesmo que tudo pereceu desde aquele dia?
Eu acredito que não.
Ou pelo menos não quero acreditar em tal, é surreal quando se pensa nisso.
Ultrapassa-me.
No entanto, tenho sempre falado contigo.
Tenho andando a escrever para ti.
Ainda assim, esta é a primeira carta que te “entrego”.
Já há alguns meses que tinha vontade de te ir ver, porém sabes que tem sido complicado conciliar tudo.
O tempo nunca mo permitiu.
Enfim, falemos da coletânea de eventos que se passaram desde que te tornaste pó das estrelas.
Mais uma das que contempla o meu céu e que nos guia, dia após dia, noite após noite.
O teu primogénito tornou-se pai.
És avô.
E que lindo avô, com um neto tão lindo, mas tão lindo.
Muito parecido contigo.
Tem o teu segundo nome.
Irias derreter-te ao vê-lo e ao tê-lo nos teus braços…
(…)
(…)Mas o que ela faz, não deixa os outros viverem.
Nem ela própria vive.
E a vida passa…
Ao menos se houvesse oportunidade para uma conversa aberta….
Tenho tantas saudades tuas.
Oiço a tua voz, acarinho o seu som e sinto o teu sorriso e abarco-o na minha mente.
Que memórias!
Enfim…
(…)
(…)Valerá a pena todos os dramas?
Valerá realmente a pena?
A vida passa e as pessoas importam-se com superficialidades e com insignificâncias.
Valerá a pena odiar?
Digam-me, por favor, o que se ganha com isso?
Só estupidez…
Só queria e quero paz…
(…)
Ainda há 2 anos felicitavas-me, com uma festa no cabelo, pelo meu desempenho na faculdade.
Foi um dos nossos momentos raros.
Nossos.
O ambiente era pesado, tenso.
Mas este toque deu-me mais do que forças.
Momentos raros tornam-se únicos e mais eficazes do que nunca, no que toca aos efeitos e impactos na alma.
Sabes que não tivemos a melhor relação, mas as relações ficam mais fortes quando construídas.
A nossa estava a tempo.
Nunca é tarde.
Agora, a nossa relação constrói-se com base em memórias, essas que se cristalizaram no tempo e que perduram.
Constrói-se, ainda, pelas conversas não-físicas, não-presenciais materialmente, mas com íntimo significado espiritual.
(…)
Foste o melhor.
Aprendi que a ausência faz a saudade crescer, e de que maneira.
E aprendi-o da pior maneira.
Ainda assim, cresci bastante, pai.
Ao que sou hoje, devo-te a ti.
Desejo-te o melhor dos universos, onde quer que estejas.
Amo-te. Beijos.