De nada me acusa a memória!
Memória de Si-esquecida!
Porque passei rápido pelas gentes,
como surdo e cego - perdido ...
Vivi ausente, em paralelo, nostálgico,
longe da Alma - vencido ...
Percorri todo o mundo conhecido:
palcos e cenas - estações...
Subi, sulcando montanhas,
caí vencido em abismos,
sempre contemplando o amanhecer ...
Mergulhei no silêncio dos lagos,
decifrei em mim as negras nuvens
e toquei no intimo do meu Ser!
Servi-me do Tempo reconstruindo o Passado.
Criei-me, recriei-me e tornei-me a criar
ao sabor do vento - sem tino!
Ergui o Presente, tracei o Futuro,
criei novas linhas nas mãos -
- e dei-as ao destino ...
Agora, centrado e imóvel,
sinto Luz, o que me surpreende!
Porque vejo nos outros
os olhos que me espelham,
as bocas de quem me Ama...
E Eu quero amar-te! A ti! Sobretudo a Ti ...
Escuto as musicas que me prolongam,
os sons que me definem ...
A solidão não destruiu em mim a inocência
nem o sonho da melodia! E as notas soam ...
Mergulhei no abismo e sai de novo,
com as asas limpas - definido ...
O Coração que escondi - perdido,
cresceu a monte, em segredo - ungido!
Todo o solo fértil é escuro
porque está de Deus munido...
- e Eu sou Esse Solo -
Chegou em mim o momento sabido, esperado,
do Tempo abolido ...
Envolto em mistério e desconhecido,
potencial no vazio, tão cheio de estio ...
Despido d'imagem, rasgado de memória,
liberto do cenário, passo Véus
q'inda me dividem e separam.
Porque eu sou Ricardo! Infinito! E não acabo ...
Meu amado ... meu Amado ...
Ricardo Louro
- no Café a Brasileira, no Chiado, em Lisboa -
Ricardo Maria Louro