CONTEMPLAÇÃO E FASCÍNIO
Parece que nasci desconfiado:
É um meio eficaz de autodefesa.
Retrocedendo uns anos ao passado,
Pretendo analisar-me, com frieza.
Já despontara em mim a juventude:
Nos sonhos, a razão do meu viver.
Respira o coração, feliz, saúde:
Só manda, bem ou mal, o meu querer.
Sendo homem, desejava a companheira
Doce, que a minha vida completasse.
Sonhava-a mais que linda: verdadeira
E terna: os meus carinhos partilhasse…
Para mim próprio fui grande surpresa,
Dado que sou bastante reservado;
Muito depressa a tua gentileza
Me cativou, deixando-me gelado…
Julguei-te inacessível ao amor;
Porém tua presença me agradava.
Eras um gelo doce e encantador,
Que pensei repelir-me e… fascinava…
Foi curta a convivência que tivemos.
Naquele lar, que a muitos hospedou.
Contudo bons amigos nos fizemos,
Elo que aos poucos solidificou.
Cingia-me de paz a tua calma;
Quase pisas o chão suavemente…
Vivia ao pé de ti, num estado de alma,
Como em adoração dum ser ausente…
Privei-me de ir além duma amizade
Que te envolvia, cheia de ternura!
Parti; ficaste, ainda; que saudade
Sinto, ao dizer-te adeus, naquela altura!
Por mim passavas, como terna aragem:
Bela flor, que jamais sonhei colher!
Conservei-me à distância duma imagem
Que deslumbra e transcende o meu querer…
Perguntava a mim mesmo, ingenuamente:
.que pensará de mim esta pequena?
Conheceu-me tão pouco e… certamente
Nada sou, para ela; e tenho pena!
Ausentei-me, sem nunca te esquecer,
E consegui a tua direcção.
Não haveria mal em te escrever…
Menor seria a minha solidão…
Mais amigos ficámos nesta ausência;
Agora nem pareces tão distante!
Vou-me abrindo em alguma confidência;
Cada vez belas, menos hesitante.
Ouves-me sempre, muito atenciosa;
Já não fujo ao prazer de te falar!
Acabarias sendo preciosa:
Agora bem me irias ajudar…
Apareces-me então toda prestável:
Vejo-te inteiramente ao meu dispor.
De há muito tempo te sabia amável:
Só tenho a gratidão, como penhor!
Tempos sem fim ficámos sem saber
Dos nossos paradeiros; mas… um dia,
Telefonei-te; logo oiço dizer:
-Olá, Chico! Estás cá? Lembras-te? Eu, ria…
Ouvir a tua voz; oh, que saudade!
Estávamos tão longe, infelizmente!
Que grande emoção tive, na verdade
Nem sempre é bom dizer-se o que se sente!
A nossa intimidade hoje é maior:
Vibrei ao ler a tua confissão!
Como tantas, sofreste, por amor!
Que surpresa; és mulher! Tens coração!
E continuas livre, como as aves;
Talvez com penas; nada se adivinha!
Se existem, oxalá não sejam graves!
Querida: porque vives tão sozinha?!
Os sentimentos que me despertaste,
Talvez aqui não tenham descrição!
Juro-te: desde há muito conquistaste
Um lugar firme no meu coração!