Poemas : 

A leste das minhas mãos

 
Tags:  Monólogos vivos  
 
Um dia apeteceu-me perseguir as palavras certas.
Aquelas que são feitas das coisas que nascem,
que vivem, que crescem, que fazem morrer.
Aquelas feitas da consistência dos sonhos,
do risco das asas, do prolongamento do olhar,
da fé dos silêncios, de sorrisos limpos
ou de pensamentos fáceis.
E das coisas fundas... ah, das coisas fundas,
como não querer achar a profundidade certa
onde se encontrem palavras que as saibam...?

Apeteceu-me a criação, a original forma de dizer.
Terras novas.
O puro descobrimento.
...
As palavras ardem. As palavras são cinza, são fumo a acontecer.
Queimam-me as mãos, reduzem-me ao nada, dispersam-se ao vento.
São sinais...
Só meros sinais.

Como dizer da indelebilidade dos gestos?
Como dizer da nitidez dos efeitos,
da heterocromia do olhar,
da essência das águas
que nos percorrem em grito?...
Como dizer da sede que nos fica, depois da vontade?...
Ou da fome que nos beija a boca, depois da saciedade?
Como dizer por palavras
que a vida não é feita de domínios, nem de fronteiras?
Que as frases não se reduzem a marés lavradas?
Que a vida não é feita de sinais, mas de Marcas...?

(ah, um dia ainda hei-de inventar palavras Verdadeiras...)

A vida é mar em desassossego, e as palavras que eu persigo
são a sua espuma viva
vestígios de luas a leste das minhas mãos
ilusões de vela náufraga
sangue sem pertença flutuando à deriva
pedaços de madeira onde me agarro
murmúrio indefinível dos lugares onde já fui
e onde não mais voltarei.

E o meu papel, o barco que abandonei.





...


Teresa Teixeira


 
Autor
Sterea
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1837
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6
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Enviado por Tópico
Jmattos
Publicado: 08/11/2013 21:44  Atualizado: 08/11/2013 21:44
Usuário desde: 03/09/2012
Localidade:
Mensagens: 18165
 Re: Perseguição
Parabéns Poetisa!
Esse poema é um convite irrecusável à reflexão! Levei! Beijos!
Janna

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 08/11/2013 22:13  Atualizado: 09/11/2013 11:15
 Re: Perseguição
quanto mais intimidade temos com as palavras, mais elas nos escravizam... (é preciso (re)inventarmos palavras, próprias, para despistarmos-nos das já concebidas, desviarmos-nos dessa compatibilidade óbvia; quase uma agonia na ponta da pena...)
bj e meu abraço caRIOca

Enviado por Tópico
Vania Lopez
Publicado: 09/11/2013 04:21  Atualizado: 09/11/2013 04:21
Membro de honra
Usuário desde: 25/01/2009
Localidade: Pouso Alegre - MG
Mensagens: 18598
 Re: Perseguição
se o tempo não esquece
onde irei deitar o vento
e em palavras deixá-lo passar?

apetece-me deixar o verbo sorrir e sonhar
ser gesto... um tufão de serenidade.

beijo de além mar

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 09/11/2013 13:53  Atualizado: 09/11/2013 13:53
 Re: Perseguição
os poetas querem ir sempre além de tudo, nada os contém, porque têm uma alma imensa, e os sentidos tão apurados, e os sonhos tão elevados. mil parabéns pelo teu poema.

Enviado por Tópico
Betha Mendonça
Publicado: 09/11/2013 22:24  Atualizado: 09/11/2013 22:24
Colaborador
Usuário desde: 30/06/2009
Localidade:
Mensagens: 6700
 Re: Perseguição
Não há necessidade de inventares palavras.
Os versos deste intenso e reflexivo poema
disseram o que precisava ser dito.
Trabalhas muito bem as palavras!
bjs

Enviado por Tópico
Liliana Jardim
Publicado: 25/11/2013 11:32  Atualizado: 25/11/2013 11:32
Usuário desde: 08/10/2007
Localidade: Caniço-Madeira
Mensagens: 4420
 Re: Perseguição
Um texto escrito no fulgor das palavras, daquelas que sabem ser mais alto...

Gostei de te ler poetisa

Beijinhos

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 30/06/2016 10:45  Atualizado: 30/06/2016 10:45
 Re: As palavras que nunca aventarei
Ficou lindo, parabéns.
Mas de tudo traduzido, fico com a palavra amor.
Vale, mais que todas as riquezas do mundo.
Pois muitos, o procuram, muitos o cantam.
Mas poucos o tem.
Beijos.
Portoguês
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 30/06/2016 11:59  Atualizado: 31/08/2016 14:28
 Re: A leste das minhas mãos

Leste nas minhas mãos
As veias que se destroem
E os sinais que vêm da lembrança
Pintados a castanho negro

Leste nas minhas mãos
O futuro em partes,
Por ordem decrescente
E pontos de cruz

Leste nas minhas mãos
Nada que seja público
Nem valha a pena confirmar
Se indulto ou apenas aspereza

Os sinais que vêm na lembrança
Pintados a castanho negro
Leste nas minhas mãos ?
Desperança ou medo,

Peço-te não leias não...