A Lua identifica-se psiquicamente em nós com aquilo que sentimos. Ela rege as águas. Essas que nos habitam. É aí onde ficam “seladas” todas as memórias que nos tecem. Intenso poço de memórias. Poço das nossas águas. Águas que também somos. A Lua é o que falta ao Universo! Planeta morto sem memória pejado de memória infinita. Memória d’águas fundas. As nossas águas. Intimas águas! A Lua é o que prende à Terra, o que não é solarizado. Inconsciente que nos precede, vazio que nos habita, intervalo entre nós e a Vida que só na experiência deste mundo poderemos resolver. Ela é aquilo que já somos não sendo ainda. Sempre em constante e progressiva auto-descoberta - é a nossa Evolução …
A Lua liga ao Passado. É um lastro-de-memória. “Isso” que já vivemos. “Isso” que já passamos. “Isso” que já fomos. É as Pegadas na areia na “Praia” de cada um. “Praia” onde caminhamos, mais ou menos ligados à Consciência da Alma que nos habita, o Verdadeiro-Deus, “Esse” que é interno.
Lua, essa lonjura, essa distância, esse vazio, essa falta que tentamos resolver ao possuir - fria-ilusão! Falta que nasce em nós de uma remota e longínqua memória de perda “esfumada” na noite-dos-tempos. Memória de Unidade perdida nessa noite que somos. Ela é a ausência do Ser que sentimos, a falta da consciência de Deus-em-Nós. É a falta, mãe de todas as faltas que em nós brada, que em nós grita, que em nós geme! O eco da Alma que se escuta nesta intima e profunda passagem de Pegadas na Areia. É a passagem de todos e cada um. Intimo “Espelho” onde já nos reflectimos sem nos vermos, medo que também já nos assolou. O medo da falta de Deus!
Mas Deus nunca se esgota! Deus nunca se retira! Ele sempre está presente no Presente! Somos nós que o não vemos. Porque só os olhos da Alma o poderão reconhecer um dia. Para ver-a-Deus é preciso vermo-nos antes a nós mesmos. Encontrarmo-nos connosco próprios!
Diz a passagem das Pegadas na Areia:
“ Uma noite eu tive um sonho …
Sonhei que caminhava na praia com o Senhor
e que no Ceu passavam cenas da minha Vida.
Para cada cena que passava,
percebi que eram deixados dois pares de Pegadas na Areia:
um era o meu e o outro do Senhor.
Quando a ultima cena da minha Vida passou diante de nós,
olhei para trás, para as Pegadas na areia, e notei que muitas vezes,
no caminho da minha Vida, havia apenas um par de pegadas.
Notei também que isso acontecia apenas
nos momentos mais difíceis e angustiantes do meu viver.
Perguntei então ao Senhor:
- Senhor, tu disseste-me que, tendo eu resolvido seguir-te,
Tu sempre me acompanharias no meu caminho!
Contudo, notei que durante as maiores tribulações do meu viver,
havia apenas um par de pegadas na areia.
Não compreendo porque me deixaste Tu nas horas em que mais
necessitava de Ti! Porque me deixaste sozinho?!
E o Senhor respondeu:
- Meu querido filho, jamais te deixaria nas horas
de prova e sofrimento …
Quando viste na areia apenas um par de pegadas,
eram as minhas. Foi exactamente ai que te peguei
ao colo!"
A Água do mar indirectamente presente no texto é esse poço fundo de memória que nos habita. As Pegadas na Areia são o Passado. Elas sucedem-se no chão à medida que as cenas passam intercaladas no firmamento, diante do olhar de quem as viveu. Este é o lastro-da-memória que sempre fica em nós, reflexo de um Passado que já foi Presente e que sempre recordamos ao olhar para trás. Passado com que mais ou menos nos encontramos resolvidos e pacificados, ou não, no momento Presente que vivemos! Resultado do livre-arbítrio de cada um face às experiências que viveu.
E a questão? Qual é aqui, nesta passagem, a grande questão? Onde estará Deus! É e sempre foi esta a grande interrogação Existencial da Humanidade! A grande carência metafisica que a vive!
O “Personagem” do texto é alguém que já parece acreditar em Deus. Parece reconhecer que há neste imenso Universo uma Mão que Rege Tudo o que o rodeia. Nos momentos bons ele reconhece a Deus nos dois pares de pegadas junto às suas. Não por virtude mas por “esquecimento”, diria eu! Parece estranha a minha afirmação ou talvez contraditória, mas é no entanto, uma afirmação bem pensada e convicta. Já que, nos bons momentos, o envolvimento com aquilo que vivemos é tal que, poucos se lembram de agradecer a Deus ou de o rever “espelhado” inteiramente nesses acontecimentos. Eles só atribuem a Deus esses momentos - quando atribuem - depois de os já terem vivido, não durante a sua vivência. Mas nos maus momentos atribuem-lhe falta de presença de imediato. Todos se questionam onde estará Deus agora? Ele está onde sempre esteve! Onde cada um nunca o viu - nos seus Corações. São poucos os que sentem o rítmico pulsar dos seus próprios Corações com consciência! E isso é Deus-em-Nós!
Os momentos difíceis são testes! São provas para quem já acredita e oportunidades para quem nunca acreditou. Ver-a-Deus nos momentos difíceis que vivemos é, à imagem de Jesus Cristo, aceitar integrar o sofrimento e aproveita-lo, transformando-o em Crescimento Interior. É difícil! Bem sei! Mas muito inspirador …
Este texto é uma imensa nota-de-Esperança para as horas de prova e tristeza que nos assaltam a Vida! Deus deixa-nos como intima mensagem que sempre está e estará presente nas nossas Vidas, que sempre nos levará ao colo em horas de agonia e desespero, ainda que o não vejamos ou rejeitemos. Quem espera em Deus nunca fica Só porque Ele sempre está Presente na “Praia” de quem confia! No entanto, quem não acredita também estará no seu regaço. Eis a grande Misericórdia de Deus. A sua infinita Compaixão!
Pegadas na Areia é a Parábola que fala no lastro-da-memória da intima-presença-de-Deus na Vida de cada um de nós! A Eterna-memória do Deus que Somos e que esquecemos, mas que, sempre, de Vida em Vida, poderemos voltar a recordar. A memória da Casa do Pai de que Cristo nos falou. A memória do Paraíso perdido …
em Deus
Ricardo Louro
em Lisboa
no Chiado
Ricardo Maria Louro