Há vários séculos
que pássaros ilustres sobrevoam
os prédios da vasta poesia
a andorinha o rouxinol a cotovia
a calandra o pintassilgo o beija-flor
o corvo o papa-figos
e evidentemente a ave fênix
têm sido convocados pelos poetas
para povoar seus bosques
ornamentar seus céus
e preencher metáforas
eu aqui ponho a mão no fogo
pelos discriminados os que nunca
ou poucas vezes comparecem
os pobres passarinhos do esquecimento
que também estão cheios de memória
por isso aqui proponho
ao canário ao pardal ao sabiá ao melro
à viúva ao estorninho ao cardeal
à rola à gralha ao tico-tico
ao martim-pescador ao bem-te-vi
para que alguma vez entrem no verso
ainda que apenas seja como nesta ocasião
pela modesta porta de serviço
Mario Benedetti (1920-2009), escritor uruguaio.