ruas desertas passam junto ao coração,
a noite está fria, os collants continuam a vaguear pelo breu,
ao longe os faróis continuam apagados,
esperam que me aproxime.
não sei que horas são, o tempo aqui não avança,
permanece esquecido
como as árvores centenárias
que adornam a solidão do meu corpo vendido.
os gatos observam-me constantemente,
perseguem os meus passos inquietos,
as frieiras já não aguentam os botins decididos de outros tempos,
sentem o peso do chão
e as rugas disfarçam-se nas fissuras do asfalto.
as gargalhadas desfazem-se nos meus ouvidos;
a criança corria feliz, na minha memória, atrás das nuvens.
nesse momento morri
quando um homem de meia-idade me agarrou no braço:
- anda, preciso de aliviar os meus demónios, e não te pago mais do que 20 euros.
entrei no carro, debrucei-me, os sinos dispararam como
se anunciassem o meu suicídio,
era sempre assim,
questionei sem rodeios os medos
mas a fome viciada era mais potente
do que qualquer demónio com cio.
dentro da minha boca dardeja uma planta de saliva
que se alimenta de crak,
de qualquer coisa,
que me faça vir
dentro destes olhos comprimidos pela insónia,
deste frio sujo de esperma
que agasalha as heras
e me suborna os braços,
morreste-me no dia em que me matei
junto destes muros infindáveis
Conceição Bernardino