INCONFORMISMO
Casar é ter mulher, filhos, família,
Quando se é homem.
Porém nos nossos tempos é quezília:
Ou se há-de ser fidalgo ou indigente…
Quando termina o dia, e nos deitamos,
Em princípio, será para dormir.
Exaustos, mas sem sono, interrogamos:
-Bom: amanhã, que mais irá subir?!
Manteiga, leite, queijo, gasolina,
Gás, óleo, azeite, e o mais que se verá!
Remédios? Só por luxo! Nem morfina
Já nos sossega; quem acudirá?!
Que horror! Velhos e novos com catarro!
Lamenta cada um a sua sorte!
Vamos ao barracão: nem um chicharro!
Há sempre algum finório, que os exporte…
Oh, terra de lavoura e pescadores!
O que produzirás tu, afinal!?
Há quem queira que sejas só Açores:
Mas, para mim, és sempre Portugal!
Que descriminação! Tens filhos pobres!
Mas outros, levam vida regalada!
Estes, passeiam; gozam os seus cobres,
Rindo dos outros, que não têm nada!...
Isto está mal, assim, tem paciência!
É forçoso lutar, sem sucumbir.
A corrupção conduz `d delinquência;
Mas, para debelá-las, há que agir.
Longe de nós ideias conformistas,
Que só trunfos darão ao ditador!
Façamos vigorar nossas conquistas,
Exigindo mais pão, vida melhor.
Vítimas de injustiças sociais
Somos, por não vencermos o papão.
Refilemos, nem alto: -Isto é demais!
É tempo de acabar a servidão!
Temos nem aprendido à nossa custa;
Porem ninguém se emenda, infelizmente!
Se a voz dos oprimidos não é justa,
Vejam se o provam, mas, concretamente!
De impostos carregais nossa pobreza;
De longe mandais vir carros de luxo.
Que austeridade é essa riqueza?
Pudera! Foi roubada ao nosso bucho!...
Vamos, população: abre esses olhos!
Teus músculos, a força do país!
Os filhos que lhes dás, tombando, aos molhos,
Mais te enfraquecem, Pátria; e já não ris…
Caindo, vivos, neste cemitério,
Pelos abutres somos devorados!
Muito conseguiremos, falo a sério,
Quando lutarmos, todos aliados!
Chora e morre à miséria a pobre infância:
Já quase nem migalhas tem no prato!
Mas quantos têm carne em abundância
Fresquinha, para si, o cão e o gato!...
Foi a bela igualdade que nos deram,
Que dizem ser forçoso conservar.
Que espertalhões! Nem sei como puderam
Uma nação inteira subornar!
Aproveitaram bem a circunstancia
Do cansaço que havia em toda a gente!
Veio a penúria, em vez dessa abundância
Que prometeram; tal não é decente!...
Acabemos depressa com a fome.
Ou, se a tivermos, seja partilhada.
Chamando sempre as coisas pelo nome,
Esmaguemos, sem dó, tão vil cambada!