Crónicas : 

NATHALIE

 
NATHALIE
 
Nathalie recebera esse nome,por sua mãe ser fã de Julio Iglesias e dessa canção em particular.
Teve uma infância boa na Espanha, mas a família mudou para o Brasil, quando entrava na adolescência.
Ela perguntou à mãe:
_ Por que o Brasil e não outro país latino, onde se fala nossa língua?
_ Porque lá temos família. O idioma se aprende rápido e fácil.
_ Ouvi dizer que o português é uma língua complicada, tem palavras em demasiado...
_ Aprende-se! Ademais, seu pai já vai para se empregar por lá, com a recomendação de seu tio.
_ O que há de se fazer? Vou começar a separar minhas coisas.
_ Sim, faça isso; partiremos em uma semana.

Nathalie virou-se e foi na direção de seu quarto. Parou ao entrar, para olhar cada detalhe de onde passara todos os momentos de sua vida até então.

Mudaram-se finalmente: Novo continente, novas esperanças...
Tudo dera errado entretanto...

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Enquanto trabalhava no bar, Nathalie pensava:
O quanto uma decisão precipitada pode levar uma pessoa?
Estava trabalhando ali para ganhar seu sustento, desde que sua mãe ficara viúva e recebia uma pensão diminuta, que mal pagava as contas básicas...
O pai morrera de doença grave, seis anos atrás, logo que mudaram para o Brasil.
A mãe resolvera ficar. Não voltaria para sua pátria derrotada.
Nathalie terminou os estudos do secundário, mas a faculdade ficou para trás.
Precisava ajudar a mãe a se manter no novo país que estavam.
Trabalhava de noite em um Piano's Bar, e fazia um curso técnico de enfermagem durante o dia, para ter uma profissão séria.

Nathalie lembrava da Espanha como se tivesse saído de seu país naquela semana... Eram essas lembranças que a motivavam seguir em frente. Assim que terminasse seu curso, trabalharia duro fazendo plantões em clínicas particulares, porque essas pagavam relativamente melhor que o serviço público, até que depois de juntar um bom dinheiro na caderneta de poupança, viajaria para visitar sua Espanha querida e quem sabe, conseguir um emprego por lá de enfermeira?
Sabia que não seria fácil: Afinal, a Espanha estava em crise como toda a Europa, e seu diploma de enfermagem não valeria por lá, mas ela tentaria fazer um exame que validasse o seu.

Planos! Mas nada disso se dera. A mãe desenvolveu a síndrome do pânico depois de passar por dois assaltos no Rio. Outra vez ficou em meio a um tiroteio entre a polícia e marginais na rua onde passava.
Por último, fora outro tiroteio, em uma passarela da Avenida Brasil.
Mudaram-se de município para outro relativamente mais calmo e ficou tudo mais difícil para Nathalie, que agora estava mais distante do curso e do trabalho. Levava mais tempo para ir e voltar para casa.
A mãe sentia-se solitária...
Nathalie tinha um olhar triste, como dizia aquela música tão bem interpretada pelo seu compatriota...

Resolveu esquecer de vez seus sonhos de voltar à terra natal. A Espanha ficara para trás, além do oceano e seria apenas cultivada em suas memórias dos tempos de meninice.

Nathalie lia uma poesia, enquanto não chegava os primeiros fregueses do bar:

Lágrimas De Outrora

Morremos aos poucos desde o dia que nascemos
O maior desgosto de viver, é a certeza disso acontecer.

Um nó na garganta inseparável do ser humano
Palavra muda.
Há dor, mesmo que se tenha em volta, algum amor.

Não é minha culpa, os desatinos de outros,
Mas, pago por eles...

O nó a que me referi, são lágrimas sentidas
Vindas de uma tristeza, de nada ser mudado em minha vida....

Escrevo então.
Essa é minha única auto ajuda.
Bastava apenas ter um ouvinte aos meus queixumes!
Mas o analista se paga.
O amigo, escuta de coração.
Pena, não ter um ombro que possa chorar minhas mágoas!
Os gritos se calam.
Permanecem mudos na garganta.

O nó só se desata, quando coloco as palavras no papel.
Dizem que faço drama.
Que culpa tenho eu?
A vida escreve nossa novela particular...
Apenas escrevo,
Não posso me revoltar.

Fátima Abreu

*A CANÇÃO:
NATHALIE
 
Autor
FátimaAbreu
 
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