Ontem chorei tanto que quase sufoquei
Parecia uma torneira defeituosa, escorrendo sem parar.
Irritei-me comigo mesma, não queria me derreter tanto assim.
Mas, não sei por cargas d’águas, mas amanheci mal por dentro.
E por quê?
Não sei.
Apenas estava assim, chorosa não, destruída, arrasada, no fundo do posso. Mas ainda não havia acontecido o pior.
A manhã foi sendo uma sucessão de derrotas sem precedentes na minha história.
Primeiro não estava com vontade de sair da cama, e como era domingo fui enrolando nas cobertas quentes, achei aquilo deprimente, olhei no relógio e eram nove horas, então vencendo meu azedume inexplicável, sentei-me na cama, levantei e andei feito um espantalho com meu pijama velho dois números a mais para a cozinha.
Estava sozinha no apartamento, e senti tanta vontade de tomar café com alguém, mas não havia essa alma pra dividir meu pequeno espaço e minha enorme solidão.
Até meu gato siamês já havia sumido há mais de um ano quando eu resolvi um dia passear com ele debaixo do prédio, sou idiota mesmo, pensando que gato é cachorro.
Suspirei, e procurei superar essa melancolia besta.
Bem, fui pra máquina de café e percebi que a mesma não ligava e comecei a tentar encontrar um diagnóstico para a coitada. Nada compreensível. Bem desisti, então resolvi esquentar água no microondas. E pra minha surpresa vi que não havia energia elétrica no apartamento. E como a fatura é débito em conta, concluí que o problema era com o prédio. Liguei para o porteiro: - Ailton está faltando luz na rua? Ele disse que apenas no prédio, mas havia deixado o aviso em todas as caixinhas de correspondência, e como eu só vou lá uma vez por mês não ficara sabendo que justamente naquele domingo iriam trocar umas fiações antigas e que o prédio ficaria sem energia elétrica de nove às onze da manhã! Droga! Resolvi levantar da cama e ter algo quente só depois deste horário! Por que não levantei dez minutos antes?
Bem, então era usar o velho fogão. Mas e os fósforos? Havia séculos que não usava fósforos. E lá vou eu procurar numa gaveta emperrada do armário da cozinha, e a marrenta estava tão emperrada que puxei com tanta força que a mesma soltou-se com toda violência e fui jogada de encontro a parede e a gaveta veio como um morteiro certeiro no meu pé.
Carambá! O grito passou direto da garganta para meus miolos e travei de dor convulsionando rolei pelo chão gelado, muda, abraçando o pé com meus dedos, mas sem remédio que apaziguasse a maldita pancada.
Bem, hoje posso até rir da situação, que de terrorismo “gavetal” tornou-se uma lembrança hilária, mas aquele momento foi uma total humilhação.
Eu só queria minha caneca com leite e café quentinho pra começar o dia, e acabo no chão da cozinha, de pijamas, descabelada, e por cima, com o pé inchado feito um pão mofado.
Então comecei ali mesmo na fria cerâmica a desaguar todo meu pranto. Embora pareça engraçado agora, eu chorava copiosamente. A dor física virando motivo para minha tristeza dominical que não havia explicações.
Sentia-me derrotada e sozinha, ridícula e patética. A dor no pé era tamanha e competia com a minha dor de âmago.
Precisava fazer alguma coisa, precisa sair do chão e parar de chorar, lembrei do gato traidor, se ele estivesse aqui pelo menos eu me agarrava a ele no meu sofrimento desmedido, mas nem isso era possível. E chorava mais e mais.
Foi aí que tive uma idéia! Levantei cambaleante, mancando e faminta, de olhos inchados.
Alcancei uma lata de suco de uva ligth que tinha na despensa com uns biscoitos velhos do vidro, e lembrei do meu tablet.
Chorando ainda, feito boba, e mancando feito um orangotango com um prego no pé, peguei o danado de tela de vidro, me ajeitei no sofá, e comecei mesmo chorando a escrever a porcaria deste texto.
Desculpem, mas tinha que parar de chorar.