Vejo os sorrisos vagos,
O gesto próprio dos fracos,
Enquanto murmuram que a guerra acabou.
Ouço a tremura na voz,
Enquanto conversam a sós,
E desfrutam do pão que o Diabo amassou.
Enumero mentira por mentira,
Nas falas mansas do dia a dia
E nos olhares vestidos de cobardia
Daqueles que pensam tudo menos o que dizem.
Conto pecado a pecado,
Enquanto se esvaziam os pratos
E se quebram os votos de honestidade
Como sendo a verdade heresia.
A guerra não acabou!
Não é finita, como se anuncia!
Grassa nas mentalidades,
Alimenta-se das falsidades
Que desde o almoço à liturgia,
Celebram a pequenez da humanidade!
A verdade, a verdade!
Coisa maldita que tantos invocam!
Poucos saberão o que ela implica,
Na sua rotineira insabedoria
E na ignorância que os abençoa
A cada gargalhada estridente!
"Ha! Ha! Ha!" - Detritos de gente!
Que se reclude em casas sem tecto,
Pensamentos sem nexo,
E escondem a carapaça
Com a cabeça a descoberto!
Mas quem está certo?
Quem é juiz?
Os honestos trabalhadores,
A vizinha Maria das dores,
Ou a mera meretriz?
Quem protege a veracidade
De cada palavra que diz?
Num mundo em que as sombras são a luz,
A noite é maior que o dia,
E a existência é uma freguesia
Sem moradores de permanente estadia,
Qual a ponte entre o real e a utopia?
Qual o elo entre a verdade e a vida?
Oh, que me tirem daqui!
Protejam-me de mim!
Pois tudo isto digo em vão,
Num esforço para alcançar o vento
E calar esta inquietação.