Tá admito, tive uma crise. Não foi tão ruim quanto a última, não tentei cortar os pulsos ou coisa do tipo, mas foi uma puta crise. Briguei com os meus amigos, na verdade, briguei com quase todos por motivos banais e coisas sem sentido. Também briguei com ela, uma grande injustiça admito, mas fazer o que, briguei.Li outro dia que isso acontece com a maioria dos dependentes químicos que tentam largar o seu vício, crise de abstinência, comigo não poderia ser diferente, não controlei e desde o princípio eu tinha o conhecimento que uma hora ou outra iria acontecer.Por sorte o celular estava sem crédito, mas isso não me impediu de magoar algumas pessoas pela noite, muito menos de jogar grande parte daquilo que conquistei no lixo. No fim estava estagnado, cansado, esgotado e todos os adjetivos que você pode pensar para esgotamento.
Uma amiga disse que eu deveria chorar, outra disse que deveria fazer uma academia, caminhar, ou pelos menos sair e dar uma volta pelo meu bairro, até pensei em aceitar a sugestão, mas o meu modesto bairro não é lá muito estimulante. Um colega de trabalho disse que eu deveria mentir, fazer como todos por aí fazem acomodados com a sua vidinha, seu amorzinho e sorrisos falsos. Até que não seria má idéia, mas não gostaria de ser mais um qualquer, igual a todos, até gostaria de tocar guitarra ou percussão, mas o meus dotes musicais se limitam a poesias depressivas.
Às vezes parece que ela me trata com um certo desdém, parece que olha nos meus olhos e não vê a verdade, como se soubesse que eu não a amo, e ela tem isso como uma verdade única e fundamentada. Sempre que penso a respeito disso me pergunto porque ela ainda está comigo, talvez eu nunca mais seja capaz de me recuperar e amar novamente, mas ela permanece aqui do meu lado, não só pelos beijos, pelo sexo ou pelo companheirismo. É algo que eu no alto da minha imaturidade não sou capaz de decifrar, algo que eu nunca fui capaz de fazer por ninguém, afinal eu sempre desisti antes de lutar.
Uma amiga disse que eu deveria ir levando, afinal nos divertíamos juntos, trazíamos o sorriso na face um do outro, é uma coisa boa eu não posso negar, mas não consigo viver tendo em minha mente que é apenas isso, que não vivo com a mulher que eu amo. E nem sempre podemos viver com o amor da nossa vida, às vezes ele surge cedo demais, outras vezes sequer aparecem. Nunca será igual, as palavras não serão ditas com a mesma intensidade, com a mesma verdade que eu uma vez proferi. E como eu gostaria de amá-la.
A crise toda começou com uma poesia, fui fuçar onde não deveria e achei o que deveria ficar escondido, e disso até a crise histérica foi um pulo. Tudo isso porque em breve terei que passar pelo meu primeiro grande teste, e tomara que eu me saia bem disso.
A crise vai passar, dentro de uma semana estarei novamente confiante e com o sono em dia. Até lá terei de me policiar quase que integralmente, afinal, um ex-dependente sempre é um ex-dependente.
M.Cardoso