Chegou ao mundo um menino
mais sozinho que a primeira
estrela que acende a noite.
Nenhum pano o envolvia.
Além, do suave fulgor;
trazia o condão da infância
que aos homens faz tanta falta.
Bois não rodeavam o menino.
Nem burros, Puro silêncio
orlava o claro mistério
de um coração sem pecado.
Os pastores da comarca
cuidavam na madrugada
dos seus rebanhos. Os anjos
que navegam no céu
ao trabalho se deram
de anunciar que um menino
chegava com um recado
ao tempo da eternidade.
Mais que rês, trezentos mil
magos são que hoje dominam
os sortilégios das mirras,
dos incensos e dos ouros.
Mas nenhum deles chegou
com oferenda à criança.
As estrelas que nos cobrem
já mal sabem de caminhos
que levem o homem à frágua
onde se forjam milagres.
Os homens fugiram todos.
Infância já infunde medo:
Aquele recém-chegado
reacendia brasas murchas
e recordava que cinzas
escondem constelações
O menino, atravessando
mordidas e escuridões
não achou sequer lugar
numa estalagem do mundo.
Aconchegada na rua,
perdida ficou a infância
por entre as gretas escusas
da indiferença dos homens.
THIAGO DE MELLO, poeta amazonense, In: Silêncio e palavra, 1951.