Lembra-se do amor tão puro,
quando a gente ainda namorava?
No cantinho do cinema escuro,
aquele filme que você adorava.
As mãos no seu ombro, receios,
lentamente puxando-a para mim,
uma massagem em seus seios,
amassando sua blusa de cetim.
A cabeça já recostada no meu peito,
um afago em seus cabelos, sem jeito,
meus desvelos com a lanterninha,
era bem insensível aquela velhinha,
que poderia nos botar para fora.
Mas você conhecia aquela senhora
até me parece que foi sua vizinha
conversou com ela em particular
e de imediato saiu, ela foi embora,
e assim deixou de nos vigiar.
E já livres da velhinha caduca,
os dedos suaves em sua nuca,
mão esquerda afagando o queixo,
ajeitando-me na cadeira de freixo,
trazendo seu rosto perto do meu,
chegaria logo o momento, um apogeu.
Próximas as bocas já entreabertas,
iminentes sensações descobertas,
rosto a rosto, nariz quase colado,
finalmente o momento esperado,
firme era a intenção de beijar,
ali naquela escuridão, aquele breu,
só pensando no que a gente comeu,
para o bafo fedido não atrapalhar.
Você esperava lúbrica e tão serena,
quando um clarão ilumina a cena,
como farol no fundo da caverna.
Facho luminoso que nos espanta,
tira logo a mão da minha perna,
olho bem para sua garganta,
espantado faço uma descoberta:
- a luz vinha da sua boca aberta.
Depois que falou com a velhinha,
ela se afastou no escuro, sozinha,
aquela conversa feliz, tão fraterna.
Não, não posso comigo carregar,
a interrogação, como dúvida eterna,
Então preciso depressa perguntar:
“- Querida! Você engoliu a lanterna?”