O Sol escalda longe e nada mais que morno me sinto.
A chuva que teima em não descolar coloca uma nostalgia acrescida na já enfadada vida.
Sento-me no musgo e sinto a humidade subir pelos meus ossos.
Um banho deveria ser de dentro para fora.
Tento renovar-me mas o velho EU é ditador esclarecido.
Á minha volta as árvores murmuram entre si como se eu ali não estivesse. A minha falta de capacidade para entender o mais simples faz-me pensar em não mais cortar o cabelo.
Por estranho que pareça a Natureza decorre na minha presença.
Pareço ser um fantasma de alguém que ainda nem sequer nasceu.
Uma toupeira fareja os meus pés parecendo aborrecida por comida não serem.
Uma minhoca escorrega ligeira e sem cú nem cabeça rapidamente se afunda no úterino húmus.Uma ladina raposa morde o próprio rabo talvez comemorando o facto de ainda ter previdência materna.
Enquanto observo a vida correr solta e sem tempo as minhas mãos fazem rituais antigos.Aves diversas chegam em bandos.
O restolhar de penas,folhas e mortalhas,o jogo de luzes e sombras baralham os meus sentidos.
Um coelho cheira a erva mas não reconhece o efeito e sai sem pressa. O Sol parece perder o fulgor.Olhos ao alto.
A copa das árvores está pejada de aves.A vista custa a habituar-se.
Uma massa viva que só pode ser a mesma tem os seus olhos em mim.
Os meus movimentos.Antigos, automáticos parecem hipnotizar as aves.
A musica vem do nada.No momento em que o fogo inicia o gozo, a brisa ganha melodia, as notas esparsas vindas das aves roçam a perfeição...Até as árvores parecem pulsar um baixo sub-terreno.
O fumo percorre-me.A musica faz-me levitar. Não consigo evitar uma lágrima. A beleza sempre me emocionou.
A lágrima sendo colírio faz-me ver o estranho do caso.
As aves,grandes,pequenas,médias,coloridas ou pardas, todas parecem seguir, com os olhos, o fumo na sua marcha ascendente.
A descoberta deixa-me agradávelmente perplexo. Como se de incenso se tratasse faço movimentos circulares com o meu cigarro artesanal.
Os pássaros ondulam na direção do dito como se nada mais vissem.
O meu sorriso abre-se e Jesus está sentado a meu lado.
Encho-me de fumo até rebentar e depois dum folêgo sopro-o para o topo das árvores!
Nesse momento todas as aves abrem os bicos em uníssono,parecendo inspirar profundamente e de seguida caem mortas no chão.
A minha tristeza não é comparável ao meu espanto quando vi,juro que vi, um sorriso em cada bico das ditas avezinhas.
A necessidade estará em escrever ou em ser lido?
Somos o que somos ou somos o queremos ser?
Será a contemplação inimiga da acção?
Estas e outras, muitas, dúvidas me levam a escrever na ânsia de me conhecer melhor e talvez conhecer outros.