A neblina da manhã primaveril de ontem, brotou em roseiras mansas o cheiro divinal de uma orquestra sem igual, contudo as amostras revogaram a estilhaços sem demora. As rosas de cravos encravados aliaram-se ao desigual.
Os passos leves daquele anjo caminharam lentamente até Gabriel.
- Eu estarei sempre aqui - sussurrou ao seu ouvido - não tenhas medo.
Gabriel rapidamente abriu olhos, reconhecendo aquela voz cristalina.
- Samarah...
- Sim, sou eu - anuiu, depositando um pequeno beijo na sua bochecha - que fazes aqui sozinho?
- Culpo-me por teres partido... e saber que nunca mais vais voltar, nunca mais.
Por mais que tente, aquele Domingo ao final do dia, estará sempre gravado em Gabriel... o dia em que Samarah partira para sempre de uma forma trágica, um momento em ele ainda não consegue falar, descrever, ou mesmo enterrar. Dois anos passados em tristeza profunda, só no local do acontecimento se sentia bem, tinha a certeza que ela aparecia e ontem não foi excepção.
- Quantas vezes tenho que te dizer que foi um acidente, não tiveste culpa!
- Pronto, pronto... não te quero arreliar, só te quero voltar a amar - disse Gabriel, olhando para Samarah que voltava a erguer um enorme manto branco.
- Tu amas-me todos os dias, tonto - constatou, esboçando um sorriso - tens é que seguir com a tua vida, não podes continuar preso ao passado.
- Se esquecer o passado, perco-te, não te quero perder, quero continuar a vir aqui, só assim tenho paz.
Samarah abraçou fortemente o único homem que amara em vida, fora ele que esteve sempre ao seu lado nos momentos mais difíceis, o único que lhe fizera sorrir, compreender o verdadeiro significado da vida e do verdadeiro amor. Não se conhecia casal mais feliz que eles, quando nasceram alguém escreveu que eles tinham que se cruzar, nem que fosse por pouco tempo, mas tinham que se cruzar, era obrigatório testemunhar tal amor.
- As saudades que tenho destes teus abraços, poisar a minha cabeça no teu peito e voltar a ouvir o teu coração.
Samarah acariciou os cabelos negros de Gabriel e sorriu.
- Continuas o mesmo, as tuas palavras meigas deixam-me serena.
- Ainda bem - disse Gabriel, enroscando-se cada vez mais no corpo da sua amada.
- Amo-te... - sussurrou Samarah.
- Também te amo...!!
- Tenho que voltar - acabou por dizer.
- Já?!
O mundo não está preparado para revoluções desta dimensão, a perca de um membro fundamental da sobrevivência humana. Os restos imortais de seres amados de uma vida são relembrados constantemente em memórias enfraquecidas, em corações partidos.
- Eu volto, prometo que volto...
Bruno Miguel Inácio