Um capitalista-Chanel visita a bolsa pela última vez
Traz um dos netos do Cavaco por uma orelha
Arrasta-o quase
O puto não percebe patavina do que se está a passar
Um velho pergunta-lhe se quer segurar o martelo que inaugurará a sessão
O rapaz hesita, até porque na plateia especuladora não reconhece ninguém
Um homem, vestindo uma farda de botões dourados, dá-lhe uma ajuda:
- Vês este retrato em moldura doirada? É o teu avô a comer bolo-rei
O puto que há no rapaz, deseja um baloiço
Talvez uma taxa em sentido descendente, umas ações da feira da ladra, mas tem medo
Não sabe o que faz ali. Quer regressar rápido ao colégio Inglês
Onde os croquetes são fritos em óleo fula, por raparigas-nanys
Incapazes de atingirem orgasmos sociais porque foram vítimas de mutilação genital
Não o deixam
Colocam-lhe o martelo nas mãos, indicam-lhe um sino rotário
O rapaz badala, a bolsa abre
Um bando de abutres rouba-lhe a juventude
Entrará nos pupilos do exército pela mão do avô, já carcomida pela traça
A avó, patrocinada pela mesma clínica que levou a mulher do Soares à imortalidade
Não conseguirá falar por queda da língua
Ao lado, de câmara não mão, o filho do Passos, rebelde como um pastel de nata
Relatará tudo na revista da juventude pró-nazi
Pagam-lhe ao quilómetro para ser o arauto de uma nova era
Seu pai, entretido em mentir a si próprio, perde o nariz num cozido à portuguesa
Despede-se dos funcionários públicos com um sorriso cínico
E o povo, o povo
Toca concertina, canta ao desafio com rimas gastas e repetidas
Em cada verso falhado os artistas de merda do meu país em chaises-longues
Ruíram os pombos, depois as flores, incapazes de se segurarem
Mas no fim de tudo, há sempre um carteiro para exumar Neruda
E fazer justiça pelas próprias mãos
É uma questão de esperar, no intervalo de um Porto-Benfica
No intervalo entre o medo e a bala
Quem for capaz de amparar as pétalas cadentes do capitalismo
Que dê um passo em frente
E volte atrás