Posso sentir a tua falta
Sem nunca teres partido?
Sem nunca teres chegado sequer.
Sem nunca nos ter-mos encontrado.
Podia passar uma vida inteira
Como se acolhido
Ao calor dos teus braços,
A cada madrugada
Como que nascida
Só para nós os dois;
E ainda assim
Nunca te ter encontrado
Na estrada que leva ao sentido da vida...
Poder ter-te realmente,
Sem nunca ter-te no real;
Eis o poder da imaginação...
Serei velho;
Pintar-te-ei num quadro,
Sem ter como a minha
A mão de um pintor
E o jeito de o fazer.
Imaginarte-ei já na minha loucura
Com o corpo completo
E o rosto ainda jovem.
Vestida com o teu vestido vermelho
Que usaste desde sempre,
Desde o dia
Em que mais precisei de te conhecer.
Vinhas de uma festa sozinha,
Sobre um casaco de cabedal
Que parcamente te protegia da chuva.
Ofereci o meu guarda-chuva
E a minha companhia até casa,
Desde ai não mais só
Não mais à chuva voltaste a casa.
Ou estavas numa esquina
Que a matemática permitiu existisse;
À roda numa espontaneidade só tua,
Apenas no meio da rua
Sem o medo que eu tinha nos olhos
Que atentamente te observavam.
Então paraste!
E fizeste o mundo retornar
A girar ao sentido normal.
Olhaste pra mim.
E foi a minha terra que tremeu
Como no livro que li já demasiadas vezes.
E a sorrir disseste olá.
Nunca em outro dia
Girou o meu mundo no sentido normal.
Mas isso foi em mim
Ou no quadro que pintarei já velho,
Mas tudo sobre a tela da imaginação.
Hoje estou de luto.
Acaba o dia e não te encontrei.
Talvez amanhã,
Quando o sol aclarar a madrugada
E eu guarde no corpo
Os restos de mim.
E encaixe a esperança,
Como que por engano,
No buraco onde se encaixa o coração.
Amanhã encontrar-te-ei.
Tenho quase a certeza que sim,
Apenas não sei quando é amanhã...