Recordo em mim um marujo
Vagueando nestas ruas de Lisboa
Nas esquinas a trautear um Fado
Destemido pedaço de Mar, marinheiro
De feliz e livre voz rouca, em tom sujo,
Entre brioso Chiado e bonita Madragoa,
Triste esta sina de não se ver amado
O receoso pedaço de Mar, aventureiro.
Vejo ali mil almas, no palco do Mayer
Risos e aplausos sem temer a ditadura
Gente pobre, rica, até bastardos fascistas,
As balas perdidas, as vozes oprimidas,
O alvo sorriso tímido de uma mulher
Feito d'uma palavra docemente pura
A prometer tantas outras conquistas
D'outro novo mundo de velhas vidas.
Acordo o céu rasgado por fios de Lua
Pintado por estrelas incandescentes
Com seus olhos poetas a ler os teus
Verdades feitas de ontem, amanhã,
No bailar do Tejo ouço-te, sereia nua,
A cantar o hino dos imprudentes,
Desses inocentes crentes em seu deus,
Na divina comédia vende esperança vã.