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SALVAR A MÃE DA FORCA

 
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Gê Muniz

SALVAR A MÃE DA FORCA

Pois aqui é cidade grande. Os autos atravessam pela via de trás e pela da frente. São direitas cortando às esquerdas a causarem o ânimo alterado dos pilotos, perturbadoramente. E para onde mesmo se dirige tal gente? De onde eles, com efeito, vêm? Surgem à frente feito uma invasão de formigas. Eclode de vez o pensamento: a quem, em crua realidade, toda esta urgência protocolar engana a ponto de resultar nessa caravana de corpos e máquinas? O que é tão pujantemente importante que não permita qualquer balsâmica variante ao transcorrer dos dias, das semanas, dos meses a inevitavelmente resolver o caminhar do tempo através dessa manada fria, constante, conformada? Ah, nojosa constância itinerante, bastarda micro-rotina cigana... Se tanto não intriga seria porque se consente como natural(?) a correria na vida e, afinal, são todos os cidadãos, quase sem exceções, de posse dessa esganação de arrancar a mãe sufocada da forca. O que permanece como ideal é um gigântico afã de se chegar o mais rápido para realizar aquelas imutáveis "coisas importantes". Entenda-se por coisas importantes aquelas imprescindíveis ações incrivelmente idênticas às do dia de ontem, anteontem, trasanteontem e sabe-se lá para trás, tão iguais quanto as originadas em tal ou qual civilização da antiguidade. Um incontinente amanhã chega como o próximo irmão gêmeo de tantos vários. Ele será o mesmo amanhã imaginário da mente condicionada de agora, com os mesmos carros nos mesmos horários, nos mesmíssimos itinerários. Coloque-se aí um mês inteiro e nada mudará, garanto. Será similar (para não dizer igual) porque é um ideal convencionado que inspira o surreal que, no entanto, não se confirma e retorna apenas boçal. Quem duvida disso que, por si, confira. Porém, não se atrase em sua checagem e acompanhe obstinadamente a mesmice qual a mesmice como nobre peça do tabuleiro. Serão os tais retratos copiados, em horários exatos, photocharts implacáveis como um trem-bala japonês. Ao final, apenas um pequeno detalhe mudará: mães (sempre sobra para as pobres mães) semi-enforcadas não poderão ser mais desculpa original para justificar-se essa vida mal-fotocopiada do dia anterior.

(Gê Muniz)
 
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Enviado por Tópico
Angela.Rolim
Publicado: 12/01/2013 16:00  Atualizado: 12/01/2013 16:00
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 Re: SALVAR A MÃE DA FORCA
Oi Gê, sempre leio os teus textos, quero que saiba que muito os aprecio e este não é diferente, mas muitas vezes prefiro sair de fininho com o eco de suas palavras no meu pensamento! Um abraço!


Enviado por Tópico
Migueljaco
Publicado: 12/01/2013 16:15  Atualizado: 12/01/2013 16:15
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 Re: SALVAR A MÃE DA FORCA
Boa tarde Ge Muniz, seus versos narram o destrambelhamento do ser humano em suas correrias inúteis, sempre munidos de uma desculpa robusta para suas transgressões de transito, e outras tantas atrocidade que praticam.
Parabéns pelo seu contundente desabafo.
Um grande abraço, MJ.


Enviado por Tópico
fotograma
Publicado: 12/01/2013 17:32  Atualizado: 12/01/2013 17:32
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 Re: SALVAR A MÃE DA FORCA
me lembrou uma passagem parecida de Douglas Adams ainda nas primeiras páginas do Guia sobre trânsito

mas o rio que corria ontem não é o mesmo que corre hoje (não, essa nãoéa passagem)


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 13/01/2013 03:02  Atualizado: 13/01/2013 03:02
 Re: SALVAR A MÃE DA FORCA
Ge,
Por um momento, lendo seu texto, lembrei-me de Sampa.Tao verdadeiro seu texto, tao real.
Em Sampa eu pegava a Avenida Sto Amaro. E embora morasse a 15 minutos de onde trabalhava, aqueles 15 minutos se transformavam em 45 as vezes ate mais. Loucura total. Lembro-me que um dia, levando um americano para almocar, ele me perguntou: "Aqui luz vermelha no trafico, eh como luz verde?" rs (perguntou serio).
Eh verdade Ge. nada muda... a mesma mesmice. A mesma loucura. Os horarios exatos.
E pobre das maes, com certeza ja nao existirao mais.
Beijo pra voce
~Mary~