Ouço o mar.
Sinto no rosto o gosto a maresia
Tenho a saudade encardilhada no cabelo.
Por entre os dedos dos pés
Incomoda-me a areia molhada.
As aves voam pra outro lado.
Vejo que se aproxima uma tempestade,
Há nuvens negras no horizonte.
Algures já no meio
Desse húmido nevoeiro
E dessa raiva divina contida
Navega um pescador já muito velho
E já sem terra...
Sou eu que te procuro.
Algures numa história
Que hei-de inventar só depois.
A água vai e vêm;
Leva e trás.
Sempre algo, sempre nada.
Sempre diferente e novo;
Sempre igual ao velho novo.
As ondas dançam.
Chamam por mim,
E nem sabem meu nome!
Avanço um pouco mais,
O mar retrai...
O mar avança...
E retrai novamente...
É tímido.
Está fria a água,
Mas é quente senti-la
Tocar em mim
Entrar na minha pele,
O sal estala-me as feridas.
Sinto-me vivo.
Avanço mais um pouco.
As ondas chegam-me aos joelhos.
Sentia-me tentado a mergulhar.
Tudo chama por mim!
As ondas,
O vento,
O sal,
As aves,
Tu.
Tu és a tempestade;
Tu és a raiva divina,
Humana contida em mim.
É por ti que navego no mar
É por ti que avanço ao afogo de mim.
É por ti que tropeço nas esquinas.
Nas calçadas do passeio.
Cada viagem é uma corrida
Cada passo é uma meta
Paga chegar onde estás.
Onde navegas perdida
Na tempestade de emoções que escondo.
Deito-me.
A água cumprimenta-me em pleno.
O sal faz-me arder os olhos
A dor faz-me arder a solidão.
Tenho água nos ouvidos.
Areia nas costas.
O mar em mim...
As ondas crescem,
A raiva diminui.
Fecho os olhos
Desapareceu o mundo.
As certeza de todas as perguntas
Que eu nunca tive coragem de fazer.
Ficas apenas tu
E a água nos pulmões.
O mar em mim.
A tempestade humana e divina
A raiva contida com o teu rosto.
Afogo-me em mim.
No mar.
Em ti!
A tempestade tem o teu rosto.