soneto
lançam-me à cova dez mil braços em tumulto
repartindo entre si tesouros duma vida
achada em calhamaços e folhas partidas
donde se encontra pouco mais que mero vulto
tampam-me o caixão e não ouço mais insultos
solene adentro a escuridão oferecida
em total solidão a não ser parasitas
a roer-me a capa e alguns papéis avulsos
mas algo à deriva de mim cá permanece
ao longo de vidas que florescem e falecem
cultivada pelo espanto de novas vozes
do canto onde repouso ouço-lhes o canto
e sempre que posso ao seu clamor me levanto
e o mundo inundo de leitos, rios e fozes