a menina dos fósforos cedeu
à tentação do fogo
riscou-se do mapa do frio
trouxe à boca a palavra mais amarga
que em seu regaço encontrou
e um travo de fome habitou
o hálito das ruas
avenidas
montras
cujos vidros se quebravam
à passagem
do bafo ausente do pão
a menina imolava-se
dentro do poema
e as televisões
todas as televisões
fizeram da menina
a notícia de abertura
intervalo
relógios
automóveis
perfumes
viagens
detergentes
que prometiam a limpeza
total
global
como uma carga policial
decretada entre sofás
ministeriais
um havana sobe aos céus
enquanto
às entranhas desce
uísque de puro malte
cuja idade se perdera
por entre as linhas orçamentais
no entanto
o almeida varre
a derradeira cinza
de uma menina
que dizem
veio de um conto de natal
e a este
dizem
regressou formosa
bela e demais adjectivos
a estes sinónimos
em movimento bem marcado
a cortina desce
no palco da memória
amanhã
diz uma outra menina
a da meteorologia
vai estar tempo de praia
o decote o confirma
e a saia não mente
Xavier Zarco