SILÊNCIO NA PONTE
(Para Nete, numa semana chuvosa de primavera,
em novembro, do ano santo de dois mil e onze)
O que dizer a uma pessoa que perdeu um ente querido? Nada, eu diria. Mas sem dizer nada podemos correr o risco de dizer tudo no silêncio da fuga da dor do outro. Um olhar pode dizer o que só um cego vê, um abraço pode fazer a dor dissolver-se no calor ofertado, um aperto de mão pode passar confiança no futuro e uma oração pode trazer um Deus que justifique a morte e o vazio pesando no peito. É uma passagem, uma transmutação, uma sublimação, a evolução dos seres vivos em apenas um ser, que parece perdido, mas, na verdade, caminhando na ponte do amor universal, realizado na Terra, voltando à Essência.
Apesar de haver uma ordem natural na vida, a própria vida transgride o seu movimento nascente-poente e os que ficam na história procuram respostas onde há apenas perguntas, interrompidas pelos soluços e umedecidas pelas lágrimas. Primeiro os avós, depois os pais e bem depois os filhos. Seria natural a ordem e seria natural aceitar! Duas premissas negadas todos os dias ante nossos olhos. Existe dor maior do que perder um filho, seja por que causa for? Não. Não deve existir dor maior. Cada perda tem um tamanho, um peso, um vazio, um medo, um desespero. E aceitar parece impossível.
E a perda da mãe ou do pai! É difícil de definir a sensação de falta de chão, de berço, de colo, da mão no meio da rua, do ombro para toda e qualquer hora. É uma dor que vem do umbigo, religando e cortando mais uma vez o cordão da vida, do amor humano e do amor divino.
A família é o berço de todos os sentimentos e lugar de aprender e ensaiar para o crescimento, para que a semente se solte e seja levada pelo vento para fecundar e criar uma nova planta. Os irmãos vão saindo e casando e crescendo, levando tudo que aprendeu com quem ficou e mostrando que valeu a pena fazer parte daquela família, pois as marcas são muitas e belas; havendo beleza até nos momentos difíceis das divergências e conflitos, que faz conhecer a si mesmo e amadurecer (de criança a adolescente, daí a jovem e depois adulto) na convivência com o outro. Assim, cada irmão é como se fosse um membro de nosso corpo. Uma perna, um braço... Difícil caminhar agora. Os braços sem força. Uma vida de histórias de rir e de chorar que não mais contadas em comunhão e compreensão, passarão a povoar a memória e, necessariamente, procurar interlocutores para ouvir o passado que teima em ficar, para justificar a ausência dele. Mas serão sempre histórias de sorrir e de agradecimento pelo tempo que esteve aqui; que farão feliz a nova família que construiu. Principalmente os filhos, que ouvirão atentos as histórias do pai, para que não escape da memória.
E no silêncio da ponte que despontou no horizonte, tão longe e visível, pedimos uma travessia tranqüila para quem vai e para quem fica, pois a vida é um sonho a ser acordado a cada manhã.