Começo a ficar cansada dele...!
Sabem do que falo? "Síndrome do Calimero"! Eu chamo-lhe assim!
Começam a ser muitas as pessoas que sofrem deste mal, de forma permanente. Ataca tão fulminantemente os adolescentes, quanto os adultos. E costuma manifestar-se em jeito de birrinhas, egoísmos, queixinhas, choros sem lágrimas, chantagens e amuos. Sim, os mais crescidinhos também amuam!
Cada vez mais se assiste a pessoas que anunciam vezes sem conta, a sua retirada, mas nunca saem de cena; que anunciam aos quatro ventos ser mal-amadas, incompreendidas e injustiçadas, procurando a aceitação pela chantagem, quando têm tanta coisa na vida que as poderia fazer felizes; pessoas insatisfeitas, com o tanto que têm, transformando ninharias em tragédias.
Não! Não é tudo culpa da crise!
Esta síndrome sempre existiu. Talvez agora salte mais à vista! E entra-nos pelos olhos dentro, perturbando-nos o espírito, pois temos que aprender a conviver com quem sofre dele, a lidar com o drama, o horror e outros teatros que tais. Todos nós em períodos da vida somos atacados por ele, mas tal como as doenças normais de infância, acabam por desvanecer-se. Noutros casos demora um pouco mais. Como se diz à moda antiga, “sobe-nos à cabeça”, camufla-se na personalidade, entranha-se, provocando a distorção dela, aliando-se a excesso de autoestima, ou complexo de inferioridade. Síndrome que se traduz numa de sede de poder, de visibilidade, de brilhar mais alto que todos os outros, de preferência à custa da desgraça alheia e não pela existência de qualidades próprias, sede de se ser mais do que aquilo que se é, sem ter que se realizar grande esforço...
O mérito, a aceitação, o reconhecimento, sabem bem, mesmo muito bem. Quem não gosta? Mas custa lá chegar...O caminho é longo, é preciso esforço, dá trabalho! Cansa muito! E dói!
É mais fácil esperar que alguém escorregue e aproveitar a oportunidade, não é? E se demorar demais, entretanto até se pode dar um jeitinho... Oh! Que coincidência… Nem tinha reparado… Se falhar o plano A, vamos lá usar o plano B, verter lágrimas de crocodilo também costuma funcionar! Sensibiliza sempre os mais sensibilizáveis.
Não, a culpa também não é do Salazarismo, do Hitler, do terramoto de Lisboa, da guerra no Iraque, da queda das torres gémeas, do efeito borboleta, da vizinha beata do Sr. Manel, que reza o terço de dia e persegue gatos pretos à noite, nem da igreja cujo sino toca desenfreadamente, no domingo, de manhã, bem cedo, deixando os nervos em franja.
Serão as depressões as responsáveis? Talvez sim, nas pessoas que vivem verdadeiros problemsa, pelas agruras da vida; não pelas ninharias que insistimos em transformar em tragédias. Há pessoas a quem dá jeito uma depressãozinha, outras há que vivem deprimidas uma vida inteira.
Que chique fazer uma birra, que máximo dar um show! Costuma dizer-se… Tem uma personalidade tão forte! E ainda há quem acredite, que é tudo força do caráter.
O “Síndrome do Calimero” tem tendência a crescer exponencialmente. E pode tornar-se moda!
A culpa é dos muitos SIM’s e dos poucos NÃO’s, do excesso de permissividade.
Cada vez que um prato da balança carrega muitos Sim’s maiores são as probabilidades de um ser humano cheio de potencial, se transformar num ser egocêntrico, fechado no seu pequeno/grande Mundo, alheio ao que se passa lá fora. E o prato vai descaindo, carregando frustrações, irritações, invejas, preconceitos, raivas e outras coisas que pouco sentido trazem à nossa vida. Sofremos mais ainda e o problema persiste!
Muitas vezes para nos pouparmos, ou pouparmos os outros, recorremos ao fácil e simpático SIM. Mas os Não’s são como as folhas de Outono, que anunciam a proximidade do inverno. Esperamos que o vento as arraste para longe, desimpedindo o caminho, mas mais cedo, ou mais tarde, nas asas do mesmo vento, ou de outros, elas regressam, tal como um bumerangue, caindo no nosso trajeto.
Não vale a pena adiar o inverno. Quanto mais tarde lidarmos com ele, mais se tornará frio, escuro, penoso!
Porquê tanto medo do Não? Às vezes, na hora e dose certas traz-nos mais benefícios que um Sim. Em certas fases da vida podemos pensar que foi o responsável pela destruição dos nossos sonhos, mas mais tarde podemos vir a descobrir que serviu de base sólida para a construção dos mesmos. Um Não vigoroso pode funcionar como um potente supositório contra os nossos estados mais febris, a nossa consciência vai recuperando energia.
Por que razão sabe tão bem um SIM? Porque tem mais sabor depois de um Não! Os dois são necessários, para equilibrar a balança da vida!
É preciso atrevermo-nos a dizer um Não, sem ser por capricho, ou por necessidade de aceitação, mas um Não convicto, assim como é preciso aprender a ouvi-lo. Difícil? Ninguém disse que viver e ser feliz era fácil!
Tu, ser insatisfeito, que vagueias no Mundo, centrado em ti, já alguma vez questionaste que o Não que acabaste de ouvir, pode estar suportado pelo amor, pelo afeto? Que és amado(a) bem mais do que aquilo que os teus olhos são capazes de ver?
Viver a vida como o Calimero é como comer comida sem tempero.
Estás de dieta? Eu não!
Mar da Rocha