Dizes: - “cheiras a incenso!”
E eu digo-te que a tua voz exala o odor quente da morfina.
E bebo dos teus lábios esse eterno demónio do fingimento,
que me leva para o oriente do teu corpo no meu corpo.
A noite traz até ao nosso abismo
a fragrância da volúpia que adivinho das tuas mãos.
Inspiro-a, golfada após golfada e digo: - “cheiras a morfina!”
E o incenso do meu corpo estala em sulcos que
percorres com o mármore dos teus lábios.
Estremeço; mas agarras a minha garganta
e transbordas em mim a lava da tua malícia de que bebo avidamente.
Estou impregnada do veneno da tua essência;
e num abraço violento rasgo em ti a alma
para que possa cobrir-nos com ela.
Mas o efeito da morfina já escasseia
e o palco da nossa lascívia evapora-se
e quando dou por mim, nunca lá estiveste.
Mas nas paredes do meu quarto a tua voz ressoa, dizendo: - “Cheiras a incenso!”
6/06/2009
Ana Limão Ferreira
PS: Um especial agradecimento ao Caopoeta que me ajudou a dar à luz estas palavras.