Aquele túnel torna mais escura a já negra noite. E antes de entrar nele, parei, respirei fundo enquanto ganhava coragem e dei um passo em frente.
Lá fora está uma noite tenebrosa. A escuridão, de tão densa que é, quase se pode tocar em cada esquina, quase lhe sinto o cheiro a queimar-me as narinas e a sua presença a ferir-me os olhos. Evito caminhar a estas horas por onde a lua não seja capaz de iluminar. Mas mesmo com a lua a trazer-me algum conforto, não estou descansado, vejo o negro a engolir a rua à minha frente, matando toda a luz que lá se encontra. A cada passo que dou sinto-a como se estivesse ao meu ouvido a sussurrar-me palavras de desconforto. Nunca algo tão abstracto me pareceu tão presente.
Mesmo agora podia jurar, que enquanto estou aqui no túnel sentado, de respiração difícil e ofegante, algo me tocou no ombro. E não era algo vivo… nenhuma coisa deste ou de outro mundo tem aquele cheiro a morte… não, não não. Sinto a minha sanidade a esvair-se enquanto escrevo este diário. É melhor escrever rápido o que ainda me lembro.
Depois de ter entrado no túnel senti que a única réstia de força que tinha desapareceu dentro de mim. Os meus olhos eram a única coisa com enorme vida em mim, olhavam para todos os lados a todos os segundos, numa velocidade frenética, todo o resto do meu corpo parecia morto, apesar de estar a andar. Eu apenas queria sair dali o mais rápido possível, por isso aprecei a o passo. Mantinha a minha audição afiada como uma espada, e os meus olhos estavam cada vez mais descontrolados, o meu tacto… ora bem, o meu tacto quase não existia, estava frio como se todo o meu sangue estivesse em algum lado que não o meu corpo. O meu nariz reconhecia cheiros que até o dia eu mesmo desconhecia.
Enquanto andava e lutava por respirar naquele ar húmido e pesado, com meu coração a bater a mil, comecei a ver as sombras mudarem de forma, a principio sabia que era apenas o meu cérebro a pregar-me partidas, mas depois algo muito estranho se passou. Por cada passo que eu dava mais dois ou três passos eu ouvia, vindos da escuridão. Acelerei o passo que já era bastante acelerado, esforcei-me mais e mais para respirar e tentei sair dali. Até que encontrei um banco um pouco iluminado por uma luz quase morta que lá estava. Sentei-me e pousei os cotovelos em ambos os joelhos levando as mãos à cara e apertando-as contra os olhos, enquanto fiz isto sussurrei em sofrimento “Calma, tenho de sair deste inferno” e foi aí que ouvi uma voz, de alguém ou algo que parecia estar sentado no mesmo banco do que eu, que respondeu quase ao ouvido, de tal maneira que consegui sentir o seu hálito quente e húmido na minha orelha, “Nunca!”. Tirei rapidamente as mãos dos olhos, endireitei-me e olhei para todos os lados, e não estava lá nada, e reparei que a luz que iluminava o banco já não se encontrava acesa, e eu estava envolto na escuridão, dei um impulso com os pés como quem salta, e atirei-me para fora do banco assustado, arrastei-me com todas as forças que tinha para um canto a respirar ofegantemente e fiquei lá sentado no chão, a abraçar as minhas pernas e com a cabeça contra os joelhos enquanto dizia, e repetia, em voz baixa “isto não pode ser real”.
Não sei bem quanto tempo estive naquela situação, mas depois de me acalmar peguei no meu diário, que ainda era novo e comecei a escrever esta entrada o melhor que consigo.
Levantei agora a cabeça e vi uma luz… acho que o dia já nasceu, e os meus demónios foram-se embora, embora tenha ficado mais calmo, não consigo parar de olhar para todos os lados enquanto me vou embora deste lugar maldito. Só quero chegar a minha casa e tomar alguns comprimidos para poder dormir umas boas horas.