Queixo apoiado à mão em postura severa,
lembra-se o Pensador que é da carne uma presa;
carne fatal, desnuda ante o fado que o espera,
carne que odeia a morte e tremeu de beleza;
que estremeceu de amor na primavera ardente
e hoje, imersa no outono, a tristeza conhece.
A idéia de morrer dessa fronte consciente
passa por todo o bronze, à hora em que a noite desce.
De angústia os músculos se fendem, sofredores;
os sulcos de seu corpo enchem-se de terrores;
entrega-se, folha outoniça, ao Senhor forte
que o plasma. E não se crispa uma árvore torcida
de sol nos plainos, nem leão de anca ferida,
como esse homem que está meditando na morte.
Gabriela Mistral, poetisa chilena, prêmio Nobel de Literatura de 1945, In: Poesias escolhidas
Tradução de Henriqueta Lisboa. Ilus. Marianne Clouzot. Rio de Janeiro: Editora Opera Mundi, 1973,211 p.