Poemas : 

Como uma lambreta véia desgovernada

 
Como uma lambreta véia desgovernada
(Mauro Leal)

Uma jovem mulher e mãe
no martírio do transporte coletivo,
retornava cansada de seu prazeroso ofício de lecionar,
adormecida e recostada na lata velha com a cabeça caída,
a boca entreaberta e a baba pelo queixo escorrida,
não se continha, visto que a exaustão aniquilou as funções de seus sentidos,
a tal ponto que os gases explodiam descontroladamente
e se propagavam semelhantes aos estampidos de uma véia lambreta desgovernada,
assustando a si e aos passageiros que apertados disputavam o espaço ao redor.

De canto de olho, percebendo os rumores de insatisfação e indignação,
permaneceu na inercia sobre os braços do Morfeu, como que estivesse "apagada”,
até a chegada da sua tão almejada parada.

Envergonhada e com as mãos amareladas, suadas, e geladas,
sutilmente contorcia e torcia que o "busão" reto varasse e logo chegasse
pra que os retorcidos, espremidos e assustáveis "treques treques,
a li não mais disparassem.
mas infelizmente ainda estava tão distante,
muito adiante, bem alémmmmm,
era lá no trinta da sonhada Araquém,
e toma-lhes pum, purum, pumpum sem olhar a quem e a ninguém.

Em maus lençóis seu calafrio agasalhou, profundo respirou,
concentrou, expulsador trancou, torceu, como que desmaiada permaneceu.

Mas no frear para apear, era o que mais temia,
pois pressentia que pelo estado da rodinha enrugadinha
ao trono sem coroa não chegaria e que por ali mesmo, nos degraus a guerra perderia.
Então ainda na descida da lotação, como rojão de São João,
uma inevitável e assustadora explosão,
tamanha era a fúria do vulcão em erupção
embaraçada e desesperada com a calça borrada na fragrância de buchada requentada,
saiu em disparada, atirando feito uma "motoca" envenenada,
espalhando as larvas enfumaçadas sobre o lindo brilho da casa sintecada.

 
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MauroLeal
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