Talvez amanhã os poetas perguntem
por que não celebramos a graciosidade das garotas;
Quiçá amanhã os poetas perguntem
por que nossos poemas
eram largas avenidas por onde vinha a cólera ardente.
Eu respondo: por todas as partes se ouvia pranto,
por todas as partes nos cercava um muro de ondas negras.
Seria a poesia
um solitário filete de orvalho?
Tinha que ser um relâmpago perpétuo.
Eu vos digo:
enquanto alguém padeça,
a rosa não poderá ser bela;
Enquanto alguém olhe o pão com inveja,
o trigo não poderá dormir;
Enquanto os mendigos chorem de frio na noite,
meu coração não sorrirá.
Mate a tristeza, poeta.
Matemos a tristeza com um pau.
Há coisas mais altas
que chorar o amor de tardes perdidas:
o rumor de um povo que desperta,
isso é mais belo que o orvalho.
O metal resplandescente de sua cólera,
isso é mais belo que a lua.
Um homem verdadeiramente livre,
Isso é mais belo que o diamante.
Porque o homem despertou,
e o fogo fugiu de sua prisão de cinzas
para queimar o mundo onde esteve a tristeza.
Manuel Scorza (1928-1983), poeta peruano.