O vendaval findou.
Agora é só o vento
soprando a sua ferocidade
mais fria do que a pele
enrijecida e azulada
dos operários fuzilados.
O vendaval findou.
Agora é só o vento cotidiano,
implacavelmente morno, hálito podre.
É com ele que se tem de aprender
a lição do revés, vida vivida.
Dos tantos que saíram,
poucos, muito poucos, se reencontrarão
um dia, tomara, naquilo que foram
ou quenão puderam ser.
Por enquanto, a cordilheira transposta,
o que se alteia
é o desvario da boca,
é cada vez mais o muro
entre a boca e a mão.
Aos que sonhavam mesmo, vendo o claro,
e que puderam permanecer
no coração ardente da sombra,
cabe o labor maior da aprendizagem.
É aprender com tudo o que foi feito
e também com tudo que deixou de ser feito,
como rasgar o caminho da esperança
que lateja, que lateja,
na frágua da paciência operária.
O vendaval findou. Telhados ocos
não poderão servir de abrigo a pássaros.
Thiago de Mello, poeta amazonense, In: Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida. Ed. Civilização Brasileira, 6a. Ed., p. 38.