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O esquecimento azul (parte IV)

 
O esquecimento azul (parte IV)
 

Lúcio, o mentor jovem de Francis, bateu a sua porta de manhã com um sorriso gentil:
_ Bom dia, Francis. Como está no dia de hoje?
_ Muito bem, obrigada. Lúcio, posso fazer uma pergunta?
_ Mas claro, estou aqui para te responder mesmo.
_ Posso começar minha colaboração com o "Complexo do Amanhã"? Quero me sentir útil aqui.
_ Sim. Como você é escritora, te enviarei para a sala onde todos eles estão, já trabalhando nisso.
_ E o que vou escrever lá?
_ Você terá relatos de nossos amigos que estiveram na Terra, passando suas provações, e explicará as muitas vivências deles, para formar seus livros. Depois desse processo de formação dos livros, irá então escolher um escritor ou escritora da Terra, para enviar as mentalizações através da psicografia.
Mesmo que os escolhidos não sejam ligados aos assuntos espirituais, eles receberão essas diretrizes e farão seus livros através da suposta "inspiração"repentina, que tiveram... Compreende agora a importância de seu trabalho como escritora?
_ Sim, agora entendo porque me trouxeram para cá. Me sinto bem em saber disso. Quero começar já!
_ Vamos então, te levarei até a "sala da escrita".
Ela sorriu feliz de começar enfim seu trabalho ali. Francis detestava a ociosidade desde sua estada na Terra. Era uma pessoa que estava sempre para lá e para cá fazendo muitas coisas diferentes. Seu antigo sogro, dizia que parecia uma 'formiguinha', pelo tamanho, e como era trabalhadeira!
Lúcio ofereceu o braço a Francis, que o enlaçou. Seguiram pelo prédio até chegar na tal sala. Era bem ampla e lá já se encontravam vários escritores, alguns vestiam trajes de sua época. Ela então perguntou para Lúcio:
_ Por que eles não usam as vestimentas habituais daqui?
_ Preferem manter os usos de quando eles estiveram na Terra, muitos gostam de vestir o que usavam em sua época, e respeitamos, porque a liberdade de expressão também é isso.
_ Ah, sim. Isso é bom, livre arbítrio. Pensei que só se aplicasse as decisões tomadas na vida. Mas vejo que seja em qualquer parte, temos o direito de optar pelo que queremos para nós.
_ Sim, é isso, Francis. Claro que como toda sociedade, aqui também temos regras e para manter o equilíbrio vibratório de paz, temos uma hierarquia para ser obedecida. Mas acho que isso você já deve saber...
_ Sei sim, porque lia muito sobre a espiritualidade na Terra. Mas agora, onde me sento para começar?
_ Ali naquele cantinho azul. É exclusivamente para você. Já estava plasmado, antes da sua chegada, para que você assumisse seu papel, na nossa obra.
_ Obrigada pela gentileza, Lúcio. Agora vou sentar na minha cadeira e começar a trabalhar. Onde está meu primeiro relator?
_ Já vem, é uma senhora. Assim que ela sentar e começar a contar sua vida terrestre, você já pode escrever na sua tela.
_ Ok.
Ele deu um aperto de mão e se retirou do recinto.
Uns minutos depois, a senhora veio ter com Francis:
_ Bom dia, Francis. Sou Carmelita.
Francis Anjos, sentiu um arrepio ao apertar sua mão, uma estranha sensação de conhecer aquela senhora de algum lugar. Mas Francis tinha repassado todas as suas vivências na "sala do retrospecto", e não tinha visto em nenhuma delas, aquela senhora como participante.
Deveria estar impressionada. Disfarçando, para que a senhora não notasse seu embaraço, pediu que ela se sentasse ao seu lado e começasse seu relato.
_ Sente aqui D. Carmelita. Pode começar a me contar sua vida, estou aqui para isso.
D. Carmelita sorriu. E novamente Francis sentiu aquela impressão, desta vez foi como se aquele sorriso, lhe fosse tipicamente familiar. Algo que remotava a sua infância...
Carmelita então começou a relatar sua vida, seu sofrimento com o marido que bebia, os amantes que recorria, por não ter contato físico com seu marido, os filhos que só lhe deram dores de cabeça a vida inteira, as noites mal dormidas pelos constantes pesadelos, e finalmente a doença que a mantivera em coma por 3 longos anos.
Uma noite no hospital, o marido veio e desligou o aparelho que a mantinha viva.
Ele foi descoberto, preso, e levado a júri, pela eutanásia.
Os filhos nem se deram ao trabalho de ir ao Tribunal no dia da condenação. Ele apenas ficou preso por 4 anos, depois morreu de cirrose, como já era de se esperar, pelos anos de bebedeira... Agora ele se encontrava nas camadas mais baixas do orbe, no "Vale das sombras"...
Ela se reconciliou com ele, pois foi até lá para perdoá-lo por tudo que a fizera sofrer e também para pedir seu perdão, pelos amantes que tivera no passado.
Ali, em meio a escuridão da noite, e os gritos de dor e pavor, dos espíritos doentes pelos seus erros cometidos na Terra, eles se abraçaram e o perdão mútuo, ajudou no próximo passo da sua evolução espiritual. Estavam prontos para mais uma vez usar da vestimenta da carne e voltar a habitar o orbe terrestre, desta vez como mãe e filho.
Nesse ponto, Francis parou de teclar suas anotações para o livro, e perguntou:
_ Quer dizer que vão reencarnar, os dois novamente?
_ Sim, Francis. Eu irei primeiro, para casar e ser a mãe. Depois ele virá como o primeiro de meus 2 filhos.
_ Hummm, então terá mais um filho... E quem será o outro?
_ Será uma menina, terei um casal. Você a conhece, mas não posso revelar quem seja. Aqui temos normas, você já sabe disso, tudo vem ao seu tempo...
_ Sim, claro. Desculpe-me, acho que fui além da conta. Muito obrigada pelo seu relato, D. Carmelita. Agora do meu jeito, vou escrever o livro. E já sei até o título, que acha de "Duas vidas e o perdão" ?

_ Você é quem decide, pois é a escritora, mas gostei sim. Agora vou para minha 'aula' sobre a nova vida que terei, o lugar onde vou nascer, viver, a minha nova ocupação, essas coisas... Engraçado é, que depois temos que passar pela 'sala do esquecimento'...De verdade, não entendo bem isso: Aprendemos e depois esquecemos...


Francis balançou a cabeça levemente, concordando com ela. Então disse apertando a mão de Carmelita, se despedindo:
_ É o tal "esquecimento azul"... conheço bem isso... Boa sorte, na sua nova vida, D. Carmelita.
_ Obrigada, minha filha.
Ela sorriu novamente, e Francis compreendera tudo naquele instante...

(continua )

Fátima Abreu
 
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