Publicado originalmente no jornal Gazeta de Ouro Fino em 17/02/2002
Olho por olho, dente por dente. Esta é a famosa Lei de talião. Em nossos momentos de revolta pensamos imediatamente em vingança e, ousamos em nossa ira, declamar que “bandido bom é bandido morto”.
Consideramos a frase acima como um aforismo de desabafo, pois é muito triste acreditar em sã consciência que queiramos ser senhores da vida alheia por mais desprezível que esta nos possa parecer.
Os sociopatas, criminosos irrecuperáveis, autores de crimes hediondos, devem ser afastados de forma definitiva do convívio com a sociedade, mas seria a pena de morte uma solução ou apenas um paliativo para aplacar a dor das vítimas?
Nenhum outro meio penal tem sido mais ardentemente combatido e, por outro lado, defendido com mais convicção, nem mais universalmente aplicado que a pena de morte.
Sendo a favor da pena capital estaremos sob a veste legal, sob a mais requintada forma de homicídio deliberado e a sangue frio. Sua aplicação renega a mais indeclinável das normas de cultura: a inviolabilidade da vida humana. Em que nos diferimos dos assassinos? Apenas nos justificando com o apoio legal, o que torna a morte sobremaneira cruel e premeditada, sem nos esquecermos que a vida não tem retorno e um erro judiciário transformaria juiz e júri e, muitas vezes, a opinião pública, em assassinos.
Podemos confrontar a questionável eficácia da pena de morte através dos índices de criminalidade nos países que a conservam, com os dos países que não a aplicam ou que já a aboliram. O valor das estatísticas é relativo, mas sem dúvida demonstram a inutilidade da pena capital.
As estatísticas levantadas concluem que a persistência da pena de morte não diminui em nada a criminalidade e, por outro lado, ressalta-se que o número de execuções é extremamente inferior ao número de homicídios praticados.
Os sentimentos de humanidade e respeito à dignidade do homem que imperam modernamente nos países civilizados, repudiam a pena capital, visto que esta não corresponde ao moderno propósito das penalidades, que não é a de castigar, mas de readaptar o ser humano à sociedade. Repito: a pena de morte não é uma reação de legítima defesa, como dão a entender seus partidários, mas sim uma vingança fria, demoradamente premeditada.
A pena de morte não se apóia em nenhum direito, é uma guerra declarada pelo país a um cidadão. O rigor do castigo faz menor efeito sobre o espírito dos homens do que a duração da pensa, pois a sensibilidade social é mais fácil e constantemente atingida por uma impressão ligeira mas freqüente, do que por um abalo violento, no entanto passageiro.
As análises psicológicas das execuções públicas mostram que estas exercem perniciosa influência na população, despertando instintos sanguinários e tendências mórbidas para o crime.
A delinqüência tem que ser tratada por meios clínicos e não cirúrgicos e, por mais insensível ou cruel que seja um criminoso ele é fruto de seu meio, um homem por refazer e não a destruir. A justiça penal não pode reconhecer a própria falência aniquilando os delinqüentes, contra o dever de solidariedade humana e cristã, ao invés de procurar, na medida do possível, reajusta-los ao convívio social.
Em particular, no Brasil, se a pena capital não existe de direito, vemos em qualquer mídia, que é um fato consumado, através das ações dos grupos de extermínio, justiceiros e da própria polícia muitas vezes despreparada. As chacinas fazem parte do nosso dia-a-dia e nossa sensibilidade, embotada pela violência, transforma esse caos em estatísticas e, como deuses satisfeito com a imolação das vítimas proclamamos: bem feito! Ao mesmo tempo verificamos que a violência aumenta de forma incontrolável.
A criminalidade começa nas altas esferas, através da corrupção do poder público, que desavergonhadamente condena diariamente toda uma população inocente à morte por fome, sede, doenças que seriam facilmente erradicadas e à morte lenta e gradual pela ignorância consentida.
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