Poemas : 

a náufraga

 
da deserta silente ilha
esperando o resgate ou o fim
da ressaca e então a calmaria
contemplava uma sorridente lua marfim
e com um sorriso avistou o navio
que vagava entre os corais
a se ancorar saliente e bravio


não pensou duas vezes
em se atirar no mar revolto
das sedosas manchas espumosas
do cheiro de saudades e mofo
ondas de um oceano corpo
uma noite de luzes ofegantes
uma sirena excitada entoava cantos
fogosos os navegantes trabalhando na proa
nadou até que chegou despida a bordo


na nave louca desgovernada dançante
agarrou-se ao mastro entumescido
pela garoa suor do céu delirante
extasiados molhados assistiam os marinheiros
o subir e descer da ninfa corsária
bandeira pirata ela se erguia imponente
se esticava tremulando aos ventos
movimentos misticamente lúbricos
sob os quatro mares cúbicos
enquanto a nau relutante afundava
ela gritava sussurrante ao firmamento

o leme fremente se contorcia
girava a retardar o suplício
mas a chuva espessa escorria
jorro impiedoso dos deuses sujos
não houve desvio nem fuga
inundou-se a cabine o convés
afogaram-se prisioneiros ratos marujos
entregava-se toda a frota ao sacrifício
devorados nos selvagens rituais imorais
dos desejos prazeres kamikazes imortais


e se sentiram mais carnais
os que restaram salvos
ela os homens os órfãos
ficaram todos náufragos
ilhados na nua realidade
todos deitados calmos
a calmaria depois da tempestade


Made in ABC-SP, reporteiro, poemista, barfly, marginal do audiovisual, amante das artes em geral.

@reporteiro

 
Autor
leonardalmeida
 
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