lembras-te de quando fingimos voar?
o teu corpo mais propício a quedas
e o meu, quebrado no chão, a levitar.
hoje, ainda sinto nos ossos esse nosso voo improvável.]
depois partiste e o mundo voltou. acordou-me o mundo,]
com uivos de bombas, pintadas de demasiadas cores
para o nosso preto e branco mais do que habitual. acabou.]
vidas tiveste sete, ora curtas ora longas,
sem nem mais uma te ser acrescentada.
pelo meio várias mortes te fizeram viver
outra e outra vez, assim, respectivamente .
moraste em várias casas, invariavelmente desfeitas
estiveste em milhares de corpos com quem nunca estive.]
fizeste várias alterações de feitio ao teu pêlo
mas as garras, essas, permaneceram afiadas.
foste tu, mesmo naquelas escuridões escondido.
os teus olhos influenciaram sempre as minhas palavras,]
de tal modo que se ouviu sempre o teu ronronar:
– rhum-rhum, rhum-rhum, rhum-rhum…
em todos os passados, que estive e não estive,
escutei o teu miar.
em todas as lutas, de que sempre me abstive,
sonhei o teu olhar.
podes voltar na tromba de um elefante
que anda de cabeça para baixo, se quiseres.
eu andarei contigo repetidamente, repetidamente…
podes estar embutido nos seios grandes
de centenas, milhares de pequenas mulheres
que eu procurar-te-ei obstinadamente, obstinadamente…]
seremos um como antes: seremos nós sem os demais.
serei eu e tu, gato preto: um sonho mais do que antigo,]
sem sentido para cega gente.