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Todas as pessoas, creio, têm uma noção geral de que existem, nas afirmações, chamemos-lhe por simplicidade assim, universais e particulares. Mas não é verdade: existem universais, particulares e singulares. Explico-me, dando um exemplo. Um universal é: todas as impressões digitais. Abarca tudo, define a categoria, as características que permitem fazer todo o conjunto. Outra coisa é, se disser, «uma impressão digital nada vale». Quando me refiro à impressão digital, particularizo uma, uma unidade do conjunto, que mesmo estando isolada pertence por simpatia ao todo. Isto é um particular. Mas há ainda o singular. Cada impressão digital, pelo seu desenho, forma, pertença, tempo e lugar, é não identificável com mais nada, é sem paralelo. Na verdade, tudo quanto existe no pensamento tem simultaneamente estas três características – universal, particular, singular. Mas isso seria outra discussão, não vamos entrar nela. O certo é que, para todos os efeitos, existem estas três situações.
Um erro comum nos jovens que começam a escrever é o de insistirem fortemente em usar apenas uma das categorias. Por exemplo, há quem se perca continuamente em universais, tentando definir, digamos, o amor. Que o amor é luz, é altivez, é tudo, é a solidão acompanhada, o que seja. Estes jovens, presos à necessidade de definir tudo e mais alguma coisa, usando apenas universais, desgastam com frequência os leitores. Um universal é uma coisa com muito peso, dogmática, boa para uma fala de Deus. Deve ser usada com parcimónia, pelo seu peso imenso e força desmesurada. Que um jovem, falando todo um poema em particulares e singulares, que feche os versos com um universal. Ou, em alternativa, combine um universal com um singular, dizendo, por exemplo, que «o Amor é Rita». A definição é universal, mas define-se por uma coisa absolutamente singular, Rita. Com menor contraste, podia usar-se um particular: «O amor é sempre a vizinha do lado», sendo que a vizinha do lado, contando que seja incógnita, é uma unidade de todo o grupo das vizinhas do lado. Voltando ao universal combinado com o singular, «o amor é a minha vizinha do lado», e aí estamos novamente na presença apenas daquela mulher, única, que de facto vive do outro lado da nossa parede. Não é necessário alongar-me muito mais nesta questão, basta cada um fazer por si as experiências. Mas acrescento apenas que um discurso todo feito de particulares pode ser igualmente cansativo, «o homem pensava na linha do comboio e achava inútil o paraíso», que às vezes não é de todo descartável para um título, se for extenso. O singular insistente é muito próximo do diário, seja real ou ficcionado e, se não for equilibrado com alguns universais, é possível que o leitor ache o conjunto uma descrição fútil.
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Exemplo de combinações de definição com os três tipos:
a) O amor é a paz. (dois universais aborrecidos e pesados)
b) O amor é sempre a vizinha do lado (um universal e um particular, existência de contraste)
c) O Amor é Rita. (um universal e um singular, contraste violento)
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Recomenda-se ao jovem duas semanas de treino intenso e, é claro, várias experiências emocionais-limite, como uma viagem ao Congo ou uma tentativa de conversão de uma prostituta nos subúrbios da cidade.
João-7-dentes