Estávamos no norte de Portugal, num lugar de acessos difíceis, de povo simples e rudimentar, não existiam vaidades apenas ali existiam pastores e pouco mais.
João era o nome do filho mais novo da família Ladeira, família de agricultores e lenhadores, que apenas cultivavam o que gastavam no dia a dia e no inverno e para o seu gado, quando a neve chegasse e não pudesse mais sair para os cumes daquelas altas montanhas.
Quem vivia lá em cima era dono de uma beleza indescritível, não existiam palavras para descrever, o rio que cortava as montanhas, grande, verde escuro, inacessível e misterioso.
João e seus irmãos sempre falavam que quando fossem grandes que haveriam de descer as montanhas e irem conhecer aquele rio, para já não falar no mar, escutaram sobre o mar quando um casal de alpinistas se perdeu por ali e lhes contou como era o mundo fora dali e por acaso tinham uma foto, era azul da cor do céu, lindo demais.
De todos os irmãos João era o mais aventureiro e atrevido, era valente, passava dias e dias na montanha mais afastada da sua casa sem medo dos lobos, que por vezes atacavam os rebanhos e muitas vezes os pastores. Claro que o Bobi o melhor cão da casa era grande amigo do João, para onde ele fosse o Bobi ia atrás de cauda abanando e todo contente.
João sonhava muito pelas montanhas, tinha algumas revistas que os primos da cidade lhe levavam no Natal, era o seu melhor presente às vezes também sobrava roupas boas e bonitas que nem conseguia vestir ali pela montanha. Por vezes o João ficava a imaginar quanto eram bonitas as meninas da cidade, um dia pensava ele, eu vou ficar uns tempos nos meus primos.
O mês de Novembro já se aproximava frio demais da conta, a mãe de João começou a ficar fraca, doente, estranha, seu pai a levou para a cidade mais perto e ela ficou hospitalizada, pessoas de poucos conhecimentos e da aldeia, ele voltou para casa e pediu que o João ficasse pela cidade para ajudar sua mãe e a levar para outra cidade muito maior e com um hospital de acordo com o problema do coração.
João desceu para a cidade já com os números dos primos e juntos eles trataram de transportar Dona Benta até a cidade de Coimbra, ali ela seria bem tratada e teria bons médicos do coração.
João observava tudo com admiração, tudo era tão novo, tão movimentado e cheio de luz e vida e as pessoas, eram tantas e sempre apressadas para irem a algum lugar. Logo chegou ao hospital e os seus primos já esperavam na porta do hospital, seu tio trabalhava lá, era um excelente medico e dois dos seus primos se formaram e também ficaram a trabalhar no hospital.
Respirou de alivio quando viu que era sua família, um grande abraço, fraterno e sincero, logo deram um beijo a tia que ainda estava debilitada pela viagem, um pouco preocupada com o seu filho, aonde iria ele ficar? Pensava ela e não tinham tantas posses assim, seus sobrinhos leram o pensamento da tia e juntos falaram:
- Tia Benta será que o João pode ficar conosco lá em casa?
Por momentos Dona Benta respirou de alivio, o João não cabia de si, de tanto contente que estava e ele era um pouco mais novo, apenas cinco anos que os seus primos, um belo rapagão.
A tarde teimava em cair, Dona Benta tinha feito muitos exames ao coração, foi confirmado que ela teria que ser operada, seu caso era urgente, mas como? Tinham que arranjar um coração compatível.
Todos saem do quarto meio tristes, Dona Benta diz que quer ir passar o Natal a casa, eles tentam explicar que não pode, pois seu coração não iria agüentar a viagem. Despedem-se e todos vão para casa, João vai com eles apreensivo e triste, seu primo Nicolau o tranqüiliza dizendo:
- João tem calma primo, ela está nas melhores mãos e o meu pai tem a melhor equipa medica de Portugal, sabias?
João abana a cabeça conformado, seu tio o observava pelo retrovisor um pouco se sentindo culpado de tudo isso, afinal eles sempre viveram uma vida de pobres e afastados da sua família. Por momentos naquele sinal vermelho ele ia a pensar como conheceu a sua mulher, sorriu ela vestida de criada com todas aquelas rendas, um olhar angelical e doce e cara de uma menina ainda.
Todos buzinam muito zangados, pois o sinal verde já estava abrindo e nem sinal de rodar o motor, O doutor Carlos volta a sua realidade e pede desculpa a todos e arranca em direção a casa.
João estava abismado, entrou uma casa linda, cheia de jardins, arvores bem tratada e tudo parecia quase um castelo encantado, fora já estava a irmã de Dona Benta, como ela era linda e de fino trato, abraçou seu sobrinho chorando e o leva para dentro.
Tudo estava decorado com coisas finas, lindas parecia cinema. Irreal, as lagrimas saltavam dos olhos, pensou na sua pobre mãe, deitada naquela cama do hospital, logo seu pai iria ligar para saber noticias ele tinha que descer a montanha e ir à taberna mais próxima.
Que iria ele lhe dizer, que iria ele dizer, por momentos deitou-se naquela cama confortável, chorando como uma criança sem saber o que fazer ou pensar. Amanha é outro dia e logo se verá, tentando acalmar seu coração e por momentos sentiu saudades da sua montanha e das suas conversas com o vento e a montanha. Lembrou do Bobi, do que companheiro fiel e amigo, como ele iria gostar de estar ali, logo seu primo Andre bate na porta e entra, convida-o para sair e ele aceita, pois poderia ser desfeita e não os queria magoar. Já estavam fazendo tanto por eles ali.
João conheceu coisas lindas, moça de cinema, todas bem vestidas e bem tratadas, sentiu-se muito mal vestido, não era o seu meio, não, ele viu o olhar de desprezo delas.
Respirou de alivio quando regressou a casa de seu tio, dormiu e logo iria estar com sua mãe.
Já eram quase dez horas e João estava no quarto, sentado na poltrona quase dormitando, entrou um medico e o chama para que ele saísse um pouco, pois queria conversar. João sai e pergunta pelo seu tio, mas o medico diz que ele esta operando e logo que acabe a operação virá conversar com ele e ver sua cunhada.
João franze seu rosto de infelicidade, as noticias não eram nada boas, consultaram o banco de dados e não existia nenhum coração compatível com o da sua mãe, para piorar não davam mais que um mês de vida. João se fez forte e regressou para o quarto, Dona Benta tinha acordado e quis saber como tinha sido a noite anterior com a sua irmã, ele sorriu contou cada pedacinho dos acontecimentos e sorria pelo pasmo de sua mãe.
Alguém bate na porta do quarto, era a tia Alice, ela entrou e foi um matar de saudades que nunca tinha visto, lagrimas para aqui e para ali. Os dias passavam, João ia dando noticias aos seus irmãos e seu pai escondendo parte da verdade, ia encorajando apenas, mas seu pai sabia que algo estava muito errado ali.
João pede aos tios se pode ir dar uma volta na cidade, eles consentiram, mas não sem antes lhe colocar seus números de telefone, direção de casa, dinheiro no bolso caso ele se perdesse.
Eram ainda seis horas da tarde, Coimbra era linda, aquele rio, o belo rio Mondego que corria brilhava entre as luzes das estrelas e dos enfeites da cidade, já era noite, frio era intenso, cortante, João olha distraidamente para o mosteiro de Santa Clara, sem querer caminha até ele, sem parar, veio imagens de sua mãe ajoelhada, no pequeno altar no fundo da sua sala, era sagrado, ela acendia todos os dias uma vela a sua Santinha.
As lágrimas saltavam de seus olhos, ela sempre foi uma boa mãe e boa esposa, porque ela teria que morrer?
Entrou na igreja daquele mosteiro, ainda sendo reparado, estavam muitas obras nele, viam-se muitas velas no altar ardendo, a sua direita, ele vê um altar lindo, uma freira angelical, de rosto cheio de paz, olhos fortes e ajoelhada ali, orando.
Olhou para cima e era a imagem de sua mãe, outra irmãzinha que foi declarada Santa,
Por momentos uma paz assolou ao seu coração, chorou e chorou que toda a dor se dissipou, ele orava com tanta fé para que sua mãe sobrevivesse, pedia, que a chamas das velas ardiam em pavio acelerado e de forma estranha.
Por momentos ele parou, sentindo um estranho odor a rosas frescas, acabadas de ser colhidas, apenas existia um tipo de Rosa assim, as rosas de Santa Teresinha, olhou para eu redor, ninguém mais estava ali, a não ser aquela freirinha ajoelhada no altar na sua frente.
Ao sentir movimento ela se levanta e pergunta se pode sentar do seu lado, João diz que sim, o cheiro fica mais intenso a cada movimento da irmã, aquele rosto ele já tinha visto, mas onde? Pensava ele, conversou, ela sorria e acenava com a sua cabeça para rezarem juntos, ele obedeceu, ajoelhou-se de novo e juntos rezam.
Tudo era tão intenso e estranho, quando acabaram ela apenas diz:
- João meu filho a tua fé é poderosa, acredita, para eu estar aqui só foi pela tua fé e por teu coração bom e puro. Volta para casa dos teus tios, amanha irás ter uma surpresa. Confia filho. Vai em paz e que Deus te abençoe.
João obediente fez tudo que irmãzinha falou, confuso, pensando se ela era amiga dos seus tios ou algo parecido, mas seu coração estava aliviado, confortado e confiante.
Dormiu como já não dormia há quase um mês, acordou fazendo as suas preces e agradecimentos a Deus vestiu-se e voltou para o hospital, seus primos e tio já tinham saído, pelos vistos bem cedo, segundo a sua tia era uma emergência no hospital.
Tomou um taxi e logo chegou feliz abre a porta do quarto da sua mãe, mas ela não está lá, assustou-se, correu chamando a enfermeira.
Seu coração batia apressado, que raio estava acontecendo ali, viu a cara da enfermeira, preocupada, o coração batia ainda mais forte quase saia pelo peito fora.
A enfermeira acalmou-o, com sua voz meiga diz que o seguisse até outra sala, que lá explicaria tudo com calma, tirou um café da maquina e o mandou beber, ele bebeu, ela manda-o se sentar e também se sentou no banco da frente.
Ela de voz meiga diz:
- Menino João, o Doutor Carlos e seus primos pediram que lhe explicasse o que esta acontecer, mas, por favor, calma e entenda tudo que vou explicar.
Diz ela tentando respirar fundo de novo, ela fala:
Menino sua mãe esta sendo operada, não sabe, mas ela já foi para a sala de preparação para ser preparada, ela vai receber um coração novo que entrou na madrugada, uma jovem, dirigia a alta velocidade e esbarrou-se mesmo perto das ruínas do convento da santa Clara, a equipe de resgate a trouxe para aqui e ela teve morte cerebral, sua família, autorizou a doação de órgãos dado ser a vontade da Jovem.
João estava confuso, meio sem saber o que pensar por momentos ele lembrou toda a conversa com a irmã, não podia ser não era uma coincidência mesmo.
Vai até a capela agradecer a Deus e volta pensativo, se ela não aceitar o novo coração? O tio o avisou que isso podia acontecer, daqui a uma semana já era Natal, que iria ele falar, contar ao seu pai tudo o estava acontecendo ali.
Olha para p corredor, já ao fim de sei horas de espera, vê seu tio vindo, sorrindo, a esperança tomou conta do seu coração, agora ele batia depressa de ansiedade e alegria, abraçando-se os dois não existam palavras ali, apenas os sentimentos e amor.
Tudo correu bem, Dona Benta aceito o novo coração, recuperou rápido e ainda foi passar o Natal à casa da sua irmã ainda tinha muitos cuidados, mas o pior já tinha passado.
Quando chegam a casa, cá fora espera todo o resto da sua família, seu marido e filhos, João não cabia em si de contente e feliz, a sua tia escondeu a surpresa até dele, sentia tanta saudade dos irmãos e do seu pai.
Alegre seu pai tira uma pequena trouxa de papel enrolado em papel, sorrindo ele fala a sua esposa:
- Benta, trouxe a tua santinha, eu sabia tinhas saudades dela e liguei todas as noites a vela como tu mesma sabias fazer quanto a rezar mulher, eu não sou lá muito ligado a essas coisas.
Dona Benta feliz beija o marido, João se aproxima e olha para o rosto da imagem, fica branco, quase desmaia ali.
Seu tio Carlos o segura, todos estavam aflitos que estava a passar com o João.
João gaguejando ele fala:
- Mãezinha, ela é igualzinha a irmãzinha que ajoelhou e orou comigo no mosteiro, só pode ter sido um milagre.
O seu tio sorrindo, diz:
- O João já é um verdadeiro milagre a tua mãe estar aqui.
João sorri, e diz:
- Não importa, importa que eu confie e por isso mesmo a minha mãe está aqui e melhor ainda ganhei mais uma linda família de presente, que melhor Natal eu poderia. Obrigado meu Pai, Obrigado Santa Clara e abençoe a toda esta família sempre no amor e na partilha.
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