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Leitura de um excerto do livro "Iluminado. o renascer"

 

No final da terceira semana de internamento, estava marcado uma consulta de grupo logo pela manhã. Fui levado em cadeira de rodas por uma auxiliar para o local onde se efectuavam essas consultas. Depois de aguardar um pouco na sala de espera, chegava a minha vez de estar presente em frente à equipa médica que acompanhava todo o meu processo.
Entrei naquela sala e fiquei perante um conjunto de rostos do qual apenas alguns me estão presentes na memória. Um dos médicos presentes proferiu as seguintes palavras: “Helder, infelizmente, o tumor presente no seu joelho direito não reagiu ao tratamento de quimioterapia. Perante este facto, a única solução para que possa ficar curado passa pela amputação do seu membro inferior direito acima do joelho.”
Apesar de ter consciência, desde o dia em que entrei no IPO, onde naquela mesma sala me foi dito que aquela era uma das possibilidades a ter em conta para a minha cura, aquelas palavras foram como que uma bomba que atordoou todo o meu ser. Foi um tremendo abalo, apenas consegui proferir algumas palavras para perguntar se não haveria outra hipótese a considerar. Depois disso, um silêncio profundo emergia do meu interior e as lágrimas de dor começaram a deslizar pelo meu rosto.
Fui levado novamente para a sala de espera, aguardando que a auxiliar me viesse buscar para regressar ao piso onde estava internado. Parecia que o mundo inteiro acabara de desabar sobre o meu corpo, estava a viver um enorme pesadelo. A auxiliar veio buscar-me e, ao reparar no meu estado, também não conseguiu dirigir-me qualquer palavra.
Parecia que mais nada existia à minha volta, aquelas palavras continuavam a martelar o meu pensamento, estava em profundo estado de choque. Chegava à minha enfermaria, na hora de almoço, ainda a chorar silenciosamente. Os meus colegas de quarto aperceberam-se logo do meu estado de terror e respeitaram o meu silêncio. Tinha o tabuleiro do almoço ao lado da minha cama. Por incrível que possa parecer, sentei-me na borda da minha cama, coloquei o tabuleiro diante de mim e comecei a comer. As lágrimas caíam pelo meu rosto e misturavam-se com a comida. Tinha um nó bastante apertado na garganta, a comida mal conseguia passar.
Sentia-me completamente revoltado, não era justo um jovem de 17 anos receber uma notícia daquelas. Quando terminei de almoçar, como tinha recebido alta hospitalar, decidi vestir-me a arrumar as minhas coisas, esperando que os meus pais chegassem para regressar a casa.
A minha cama estava situada próximo da porta da enfermaria, por isso reparei na chegada dos meus pais quando eles ainda caminhavam pelo corredor. Quando chegaram perto de mim e me viram naquele estado perguntaram o que se tinha passado. De uma forma um pouco brusca, respondi que os médicos me tinham dito que ia ficar sem a minha perna. A minha mãe lançou-se a mim a chorar efusivamente, entrando em profundo estado de choque. O meu pai permanecia um pouco mais afastado, num profundo silêncio de sofrimento. As enfermeiras trouxeram um calmante para a minha mãe. Continuávamos ambos abraçados a chorar. Fazia um esforço para confortar a minha mãe, apesar de todo o meu sofrimento.
Passado algum tempo, estávamos um pouco mais calmos, a minha mãe parecia estar a recuperar daquele tremendo choque. Já no corredor, ouvi as palavras de um médico que talvez despertaram uma luz inexplicável dentro de mim. Após algumas considerações sobre o que se ia passar, ele confrontou-me e disse-me: “Helder, se queres viver, é este o caminho que tens de percorrer…”

Na tarde daquele dia, respirava novamente o ar puro e sentia a luz do Sol a incidir directamente sobre o meu ser, depois de três semanas de internamento. Regressava a casa com os meus pais e, por milagre de Deus, toda aquela revolta que havia sentido uns momentos atrás tinha sido banida do meu interior. No meu rosto despertava um sorriso ingénuo, doce e proferia palavras de conforto e esperança no diálogo que mantinha com os meus pais.
Talvez tenha assimilado que o mais importante era viver, mesmo que para isso tivesse que enfrentar um árduo e doloroso caminho…

(in Iluminado. o renascer)
 
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Moreno
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Enviado por Tópico
luciusantonius
Publicado: 15/11/2011 19:12  Atualizado: 15/11/2011 19:12
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 Re: Leitura de um excerto do livro "Iluminado. o ren...
Caro Hélder
Precisei de ler este bem elaborado texto para tomar consciência da sua pessoa como homem com interesse na palavra, mas agora, de um modo especial pelo drama que a sua vida conheceu ainda jovem.
Se há textos que exigem ser comentados este é um deles pela vivência humana que insere e muito nos sensibilizou.
Sob o ponto de vista pessoal algo teria a dizer com significado, mas que fica para outra oportunidade.
Só lhe digo que passar por cima daquilo que em determinada hora nos atormenta, é vencer. Considere-se pois um vencedor.

Agradecemos o envio do livro à cobrança
Abraço
Antonius e Olema