Crónicas : 

O Dia Seguinte - O Dia "D"

 
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O dia seguinte pode ser qualquer dia, depois do dia “D”.
É aquele dia em que você se dá conta de que agora sua vida mudou, transformou-se da noite para o dia, literalmente.

Aqueles movimentos antes tão fáceis de realizar, como andar, comer, vestir, banhar, fazem parte de um passado
não tão distante, mas que foi tragado por uma virose, que calada, apossou-se de meu cérebro e em apenas vinte e quatro horas, transformou toda minha vida.
Fui dormir como flor viçosa, e acordei como uma flor morta.
O que antes era a prioridade de sua vida, agora, passa a não ter a menor importância, ou melhor, passa a ter uma outra forma de olhar.

Repentinamente, o meu mundo alicerçado sobre o que achava ser uma base sólida, some debaixo de meus pés, e qualquer, elo mínimo que seja, tem uma importância enorme no meu novo contexto de vida.

O sonho da compra do apartamento, o sonho do carro zero, a tão sonhada viagem de férias, a partir de então, começa a ter uma outra conotação, que, já não faz desse momento da vida, deixa de ser a prioridade do momento, para apenas correr atrás de vida ou melhor de permanecer viva.
Agora que, o chão ruiu, acordar pela manhã,  já não é hora de levantar e sair para o trabalho, e enfrentar um novo dia.
Agora, é imprescindível, outro trabalho básico, de muitos exercícios de fisioterapia, de medicamentos com hora marcada, injeções, e procedimentos médicos.
Tudo feito de forma que cada músculo de meu corpo, seja trabalhado, para que a vida possa continuar a correr em minhas artérias, nos nervos sejam flexionados juntos com os músculos, alguns órgãos, como os rins, sejam, estimulados a realizarem o seu devido funcionamento, principalmente o cérebro, proporcionando fortalecimento para manter-se em plena forma e atividade.
Evidentemente, possibilitar a continuação, dos reflexos e funcionalidade das atividades corporais.
E ainda, permanecer acreditando na vida, sentindo à  necessidade de trabalhar o cérebro para manter a lucidez.
Mesmo contrariando a realidade, porque o que antes era realizado de maneira tão fácil, quase que, imperceptível, agora, todos os movimentos são arduamente trabalhosos, e numa lentidão que os minutos transformam-se em longas horas.
E alguns movimentos tão fáceis de fazer como o simples levar de um talher à boca, hoje parece ser um penoso e trabalhoso levantamento de peso.
A vida cotidiana, a rotina, tudo fica perdido no tempo e no espaço.
Devagar, vai caindo sobre a cabeça a dura e simples realidade , já não há identidade, tudo que você fez, tudo que você conquistou, é zerado. Um novo relógio da vida, é acionado e recomeça uma nova contagem.
Os sentimentos atropelam-se, é como se, uma enorme carga, fosse descarregada sobre a sua cabeça.
Antes quando era a provedora, a um pequeno toque, um simples movimento, uma pequena decisão, tudo ao redor fluía e o pequeno ou grande problema era solucionado.
Hoje, ao ver-se imobilizada sobre uma cama, as pessoas ao teu redor já não te ouvem a voz. 
Agora, a vida está à mercê, daqueles que estão em torno de um leito, são eles que ditam as ordens e que detém o comandas das decisões.
Uma voz antes ouvida e que ao simples fato de ter uma solução, um conselho, uma palavra de conforto, era respeitada, hoje, por mais que fale, ou até que grite, ou badale como um sino de longo alcance, é apenas uma voz que já não tem vida ou vibração, tudo da vida esta delegada em outras mãos, e outras vozes, e os únicos sons que ecoam em retorno , são os próprios suspiros e gemidos de dor.
Toda essa realidade vivida e sentida, é como um bálsamo para aguardar o dia, que uma nova vida, há de chegar.
Tendo na consciência de que, tudo mudou, e que tudo ainda pode mudar.
Recriar uma nova vida como uma fênix que ressurge das próprias cinzas.

Fadinha de Luz


Maria de Fatima Melo (Fadinha de Luz)

 
Autor
MariadeFatima
 
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