As agulhas de caruma atapetavam o chão num anúncio de S. Martinho com as castanhas quentes a estalar. O vento zurzia o pico dos pinheiros num bailado composto e ritmado pelo ribombar do trovão lá longe cujo relâmpago que o anunciava ajudava a apreciar com maior nitidez a natureza em fúria. Era um misto de conforto visual em contraposição ao arrepio soturno provocado pela noite que se abatia. Em cada mudança de direcção do vento os pinheiros como bailarinos bem treinados acompanhavam em uníssono os humores da tempestade. Os animais pressentindo o perigo recolhiam aos seus refúgios, ora em tocas, ora em ramos protegidos, ora em penedos, ora em ninhos. Todos tinham o seu refúgio, o canto a que chamam seu. Uns reclamaram-no com um rasto de urina que anuncia ao rival a sua presença, outros com a imponência do seu porte, outros ainda com a cor das sua plumagem, todos têm motivos de afirmação, todos reclamam o seu quinhão, não dando à natureza bruta e ingrata a supremacia do território.
O Manuel que podia ter outro nome qualquer, envolto em farrapos e em sonhos propiciados pelo álcool que as esmolas lhe renderam, reclama o seu pedaço de chão na reentrância de uma loja com um pedaço de cartão. De mijo tem aquele que não conseguiu conter nas calças nauseabundas, do porte guarda o brilho no olhar do orgulho das raízes, da plumagem colorida tem o néon acima dele que lhe vela o sono e propagandeia o turismo na terra que reclama como sua: DESCUBRA PORTUGAL, UM PAÍS QUE VALE POR MIL.