A vida é essa voragem escura que nos consome,
é a dor de nem ter como falar em esperança...
Exceto aquela de reviver o breve instante
em que juntos pairamos no ápice do gozo!
Ah, loucura, loucura — dissemos depois
de provar daquele custoso fruto proibido;
e como não havíamos de querer mais?!
Para nossos seres antes desparceirados,
viver sintetizava-se na magia do encontro!
Mas nossos descuidos foram tantos
que daquele amor só restaram cinzas!
A noite é fria e a lua ainda está alta;
ressumam as plantas o orvalho da noite.
Ainda estamos no portãozinho da rua,
e sabemos que pisaremos pela última vez
as sombras da folhagem da alamanda.
Uma luz na casa parece avisar da hora,
você já vai entrar, e eu vou subir a ladeira,
pensativo, com vontade louca de morrer,
e ruminando que a vida vale nada,
que tudo eram sombras em nosso caminho!
Os interditos da vida não nos deixaram ser;
e a nossa fraqueza só podia dar nisto: despedida!
Eu vou partir só, como antes, quando cheguei...
Mas é impossível que nada tenha ficado,
é impossível partir sem nada levar!
Ficou-me sim, esta amargura da perda —
o mal galopante da ventura desfeita!
Em mim, agora, nada é sólido,
exceto essa vontade de ir... esperança de voltar,
se alguma houve, morreu ainda há pouco
quando você voltou-me as costas!
[Penas do Desterro, 13 de fevereiro de 2001]