Ficou pequeno, um homem de Lilliput, minúsculo!
Há dias em que mais vale estar calado e não dizer pevas a ninguém, ser mudo, fechar a língua a sete chaves. Sentiu-se igual a si mesmo, teve a noção do que era e isso era novidade. Que desconforto.
O gajo era um verdadeiro incontinente, no que diz respeito a falar dos outros. Era daquelas pessoas que tinha na secretária, uma caneta e papel cor de rosa. Um verdadeiro paparazzo sem máquina fotográfica... nem era necessária. As fotografias não vendem opiniões e essa era a sua especialidade... vender opiniões.
Naquele dia, enquanto rondava o bairro "rei do social" ( fazia-o todos os dias à procura de algo), deparou-se com um aglomerado de figuras à entrada da casa dos Meireles de Sá. Aquele magote de gente ilustre era anormal durante o dia e, ainda por cima, de manhã. Afilou o nariz e apontou-o.
Estacionou o carro uns metros à frente (mesmo em cima da paragem reservada aos cidadãos deficientes) e saiu com um pequeno gravador enfiado no bolso. Devagar, chegou-se e foi-se infiltrando. Tanta gente fina e bem vestida... roupa exclusiva, de corte assinado pelo estilista. Carros de topo. Plásticas e acrescentos em todos os corpos. Estava no paraíso! Agora só precisava de fazer alguém falar sem perceber que estava a ser gravado. E aquela gente era perita em "meter os pés pelas mãos" quando abria a boca.
Dirigiu-se, insinuante e de uma forma pronta, à menina dos Meireles de Sá. Tinha-a farejado desde logo. A filha dos anfitriões era uma presença cheia, embora ainda garota.
Abordou-a com modos de alegre pateta:
-Nini Meireles de Sá! – entoou, balanceando a conversa - Há quanto tempo?! Beijinho, beijinho! Como tem passado?
Sem se deter, disparou à laia de lulu que abana o rabo:
-Linda festa, com tantos ilustres do nosso social! A que se deve o evento?
A rapariga olhou-o e, com uma expressão que não se descreve, desfez-se em lágrimas e soluços, abraçando-se ao pescoço mais próximo esvaindo-se em desgosto.
Nessa noite, no regresso a casa depois de uma animada festa, o carro onde os Sr e Sra Meireles de Sá seguiam, havia sofrido uma colisão frontal, deixando-os sem centelha no próprio local. Não tiveram hipótese.
O gajo não sabia, não podia saber e nem olhou para a expressão das pessoas... havia roupas, carros e estilo... as coisas que realmente importavam.
Aquela sensação de ser expulso por olhares silenciosos, que mordem por dentro e por fora, marca. Marcou-o.
Sentiu-se mesquinho, ínfimo e saiu dali sem palavrear mais nada.
Valdevinoxis
A boa convivência não é uma questão de tolerância.