Estou a fixar uma porta fechada que não diz nada. Que palavras agora poderiam quebrar este silêncio? Que palavras poderiam concertar os fragmentos de ideias que não consigo desvendar?
Deixo-me nua perante o escuro que me viola com toda a sua frieza, que me rouba a luz e me confude os caminhos para o Inferno.
Esse escuro pedófilo que roubou a esta criança a vontade de viver, de querer sequer sonhar, esse escuro que me rodeia e observa, mas não se deixa ser visto.
Em momentos de fraqueza constantes, desejo poder fechar os olhos e fazer tudo isto desaparecer. E entre tudo isto; as palavras que não deviam ter significado, os pensamentos que não deviam ter criador, as imagens que deviam ter ficado desfocadas; acordar é o pior.
Abrir os olhos dói e deixa-me sem forças.
Sei que, abertos, mais nada os meus olhos vão encontrar. Serão as mesmas ruelas, as mesmas paredes, o mesmo terror, a mesma luz que continua desconhecida, o mesmo nuvoeiro que se deixa pairar sobre quem já nenhumas forças tem.
E fraca, levanto-me para encarar este mundo que me acha forte, que me admira e deseja ser como eu, este mundo que não tem nada de mim, este mundo que não devia existir e que simplesmente odeio.
Não sei o que me assusta mais, não ter a que me prender ou ter demais que me mate. Por vezes, sou o meu maior medo, por vezes, assusto-me a mim mesma.
Luto contra estas imagens sangrentas que me invadem a cabeça e pedem para matar, estes pensamentos que não deviam existir, estas palavras que já quis gritar. Luto contra mim, contra a minha doentia saciedade. Não sei quem sou nem quem deveria ser.
Não tenho porquê. E, por vezes, desejava que este silêncio me sussurasse simplesmente..."porque sim". Mas continua mudo, vendo-me sufocar.
Finjo num filme demorado, sou actriz de um filme irónio sem fim, que nunca ninguém chegou a entender. Sou impossível desvendar e assim, vou permanecer. Sou apenas esta pessoa sem fundo à vista, que sorri com os lábios e fixa o vazio com o olhar, sou aquela que diz as palavras em que não crê e sonha com tudo aquilo que não deveria vaguear na sua cabeça.
E isto não é nada mais que isso, um filme irónico. Vivo num mundo que rejeito, que não tem nada de mim mas que tudo me dá dele: o escuro, o sofrimento; a Realidade. Enquanto isso, na minha mente, vivo noutro que não chega e não se encaixa, que tudo tem de meu, mas que nada de seu me dá. E no fim, são apenas isso. Sonhos. E nem sempre, no fim, ficam.
Por vezes eles perdem-se pelo caminho, por vezes eles são deixados ao lado do urso de peluche, ao lado da inocência.
Às vezes são sugados, outras simplesmente abandonados.
Já conheço o escuro de cor, deixei de procurar caminhos e de apalpar paredes.
Cansei-me destes desejos, cansei-me de falar e ouvir dizer.
Deixo-me ficar muda, sentada no chão, enconstada à parede rasgada de palavras que não fazem qualquer sentido.
Mas, se um dia tentares decifrá-las, teme o que os teus olhos poderão ler. Contem as lágrimas, elas chegarão tarde demais ao funeral de uma alma perdida, de uma mente perturbada. É isso o que sempre serei, uma mente pertubada cheia de imagens doentes, de palavras por metade, uma mente impossível de entender, uma alma que já subiu e não deixou nenhuma escada de retorno.
E, sem porquê, assim permanecerei, incógnita no silêncio assassino.
Lau'Ra