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Proscrita

 
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Fala baixinho, para que a tua voz se dilua num rumor sem rosto. Temos para ti, a branca túnica das proscritas. Guardamos-te uma mancha escarlate ao centro da testa, para avisar o mundo. Alinhamos-te por entre os cabides vazios das profanações sem nome.
Consentimos o desfile e deixamos que sejas mais uma. E isso basta, não venhas pedinchar por mais. Cedemos-te o melhor da nossa hipocrisia mais delicada. É tua a nossa benevolência, se te mantiveres na estrada de trás. Que mais reclamas tu?!... Deixamos para ti, largas avenidas subterrâneas, onde podes pisar aquém do zelo e do cuidado. Mas não venhas galgar superfícies e avançar-nos os corredores.
Pertences, ao cortejo fantasma das Mulheres-Sombra, sem corpo e sem alma, que banimos, do centro do Grande Salão e não queremos sentadas à nossa mesa, navegando nos nossos mares, aportando à branca areia das nossas praias alvas.
Trazes a perigosa ancora das palavras ditas em voz alta e uma bandeira demasiado garrida hasteada na proa. Trazes outras como tu – Mulheres-Corsárias, a reclamar águas de ninguém, leis, vontades e lutas menos brandas, menos santas, menos cegas. Senhora das Ondas de maré teimosa, nós te tememos!... Perturbas-nos o longo sono dos surdos. Desafias o acordo dos séculos, a cada vez que palpitas o pulso, contra a nossa mão pesada de pedra e castigos.
Cresce a multidão que te aguarda no paredão do cais, Senhora! Cresce a multidão que afina na toada do teu hino mais livre, mais justo, mais sensato!...
E nós, não sabemos dessa outra ordem, Senhora! Não sabemos dessa outra nação que devagar se vai rasgando dentro do nosso país. Não sabemos, senhora!...
Não sabíamos!...




Luz&Sombra

 
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Luz&Sombra
 
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