Morro porque os pássaros cantam seus sonhos,
E eu simplesmente ouço,
Sem ao menos saber cantar os meus,
Como se o meu canto
Fosse meu repetitivo Destino
– Melodia de uma caixinha de música.
Morro, pois não sei morrer,
Desfaleço, desfaço-me em letras,
Como lágrimas minhas no teu rosto ausente,
Lágrimas que queimam a superfície da folha,
Acalmando as ondas que não existem em mim
Mas que me arrastam até afogar-me em tantas cinzas
– Bailarinas caindo da caixinha de música.
São todas palavras não-minhas,
Não-novas,
Microorganismos vivos
Que não-vivem,
E que me matam a cada linha escrita,
Corroendo-me por dentro dos ossos
Até o âmago das músicas que ouço lá fora e em mim.
Morro, morro, morro e ainda vivo.
Não sei cantar meu tutano,
Não sei encantar-me com meu não-canto,
Não sei cantar meus sonhos:
Esses barquinhos de papel que queimo
Por ter posto as mãos no fogo
Dos teus olhos tão frios
Que vejo deslizarem suavemente
Na superfície da folha da minha pele em branco.
Os pássaros
Esses continuam cantando aqui dentro do texto
Nesse infinito tão vago
Gaiolas abertas para que não voem
Formando figuras que me desfiguram completamente
Músicas em uma harmonia desarmônica
Deixando-me a sós com o que há de mais verdadeiro em mim,
Minha imperfeita felicidade,
Minha alegria tão desumana,
Minha insanidade tão prazerosa,
Gaiolas em chamas para que eu não voe
– Rodo com as mãos a engrenagem para ouvir a música.
Bailarinas dançando comigo enquanto sonho.