Amarelinda...
De tudo que foi perdido naquela noite de domingo para segunda-feira do mês de abril de 1999, o que mais me doeu perder foi Amarelinda.
Chegamos na escola e encontramos o imprevisto: portas e grades arrombadas e a secretaria sem os seus tesouros! Dos periféricos do computador, só o teclado esquecido sobre a mesa, os estabilizadores e alguns fios enrolados! E a enorme parabólica , inútil sobre o telhado, já que também levaram o conversor...
Quando entrei na secretaria e mexi nos interruptores, a última folha impressa, rodopiando enlouquecida ao vento do ventilador de teto, aterrizou na marca deixada pela televisão. O vídeo também não estava lá... Não ficou nem mesmo a máquina de calcular que me acompanhou em tantas provas de estatística!
Depois do balanço das perdas e das providências cabíveis, caí em mim e percebi que perdera o livro que estava quase acabando de escrever.
Droga! Por que uma mulher de cinqüenta anos resolve abandonar seu tradicional método de rascunhar? Não devia ter decidido guardar na memória de uma máquina tantos momentos reconstituídos com dificuldade! Só que quando a escola ganhou o computador, achei que podia agilizar o registro dos fatos estranhíssimos que vinham acontecendo... Assim, em todos os instantes vagos, corria para o cantinho em que o computador ficava e digitava até que os dedos ficassem dormentes e os ombros e a nuca doloridos.
Percebi até bem rápido a perda do livro, mas as lágrimas que chorei não foram por Amarelinda... Não sabia que teria que suportar um tempo tão longo sem vê-la com seu doce aspecto humano ou sequer sem percebê-la em sua própria forma de vida...
Já estamos em meados de julho e nunca mais nos encontramos. Seus estranhos olhos amarelos, que me inspiraram ao escolher seu nome, não mais me guiaram nos mistérios da noite por lugares que jamais serão esquecidos...
Por que me parece tão difícil relembrar o enredo do livro? Por onde andará Amarelinda, nesse Universo tão grande, que nunca mais veio me buscar nos sonhos?
Preciso refazer pelo menos o início do livro. Talvez depois as lembranças fluam, fáceis como as lágrimas, que, agora sim, são por saudade de Amarelinda...
(Caso estiver interessado em mais um pedacinho do meu livro, é só dizer... Mandarei aqui do Brasil a minha história...)
Carinhosamente,
Íris Galvão.