Ele a contempla com a cabeça cheia de idéias. Ela se oferece virgem, aberta, com uma passividade excitante. Ele não escuta, mas ouve-lhe a voz saindo das entranhas, uma voz doce, macia, sussurrante:
—Vem logo, toca-me, essa espera me mata!
O homem hesita. Não pode se atirar de qualquer jeito. Sabe que logo depois quererá mais, ficará temporariamente saciado, mas a vontade voltará, e tudo recomeçará. A primeira palavra salta na mente. O mesmo gesto. O mesmo lugar. Aproxima a mão sobre o corpo branco e sem rugas.
Ela permanece estática, esperando, sabe da força que tem sobre o mesmo. É sempre assim: o dia todo pensando, pensando, pensando, arrebanhando as idéias como um vaqueiro que abóia o gado, conduzindo a manada para o destino que escolheu. Ela sabe que é preciso saber esperar, afinal quer o melhor. Não gosta quando ele se atira, ávido, desprezando as preliminares, para no final deixá-la de lado.
No começo era horrível. Olhava-a com desejo, não tinha prática. Inopinado, vexado, nervoso, se contentava logo com os primeiros contatos, a deixava incompleta, insaciada, de saia curta.
Deu um tempo.
Ninguém sabe por onde andou. Talvez um dia revele, pois sabe que ela sempre estará ali, esperando como uma tetraplégica que não pode se mover da sua cadeira de rodas.
Por fim ele avança.
Os dedos flutuam procurando sentidos. Ela pode ouvir o latejar do sangue correndo nas veias e artérias enquanto lembranças e mais lembranças são arrastadas pela correnteza de uma grande inundação.
Como vai compatibilizar tudo para depois encontrar a melhor maneira de depositar em seu corpo sem ferir-lhe a pele e posteriormente jogá-la na rua como algo descartável?
Quer ajudar, mas o melhor que pode fazer é ficar ali quietinha, pois daqui a pouco ele começará a acariciar-lhe a pele branca e sem rugas.
Sabe que ele é poderoso, tem o poder de recriar o mundo, mudar a cor da sua pele, a posição, alterar os móveis, trazer o dia ou noite, transportá-la para a África, para Marrocos ou para Sapé, uma cidade bem pequena no interior da Paraíba.
Finalmente seu instrumento roça-lhe a carne e ela sente-se renascer. Aos poucos as palavras vão se juntando umas com as outras, formado um rio caudaloso que deixa seu corpo grávido e interessante.
Depois de algumas investidas ele não resiste.
Seus olhos contemplam o corpo dela e observa que a pele reflete o resultado de sua ação constante e persistente. Mesmo com a aparente passividade ele sente que ela é quem comanda dali pra frente.
Chegou a hora de despejar tudo, procurar o clímax que o deixará nas nuvens e fará dela a coisa mais importante da sua vida, até que a inspiração faça nascer em outra folha de papel outro texto mais interessante.