Para Antonio Faria
O tempo é o grande milagre
da vida do homem no mundo.
Não tem começo nem fim.
Mas está vivo, animal
respirando imenso em tudo
que a gente quer, sonha e faz.
O tempo que já passou
te conta como vai ser
o tempo que vai chegar.
Tudo leva a sua marca,
de pétala ou de ferrão.
Tudo traz o seu condão:
a criança correndo; o rio
passando, a rosa se abrindo,
a lágrima da alegria,
o silêncio da amargura,
a luz-mansa da ternura,
o sol negro da pobreza.
O tempo é o nada que é nada.
O tempo é o tudo que é tudo,
o tudo que vira nada,
o nada virando amor,
o amor inventando estrelas,
a mais linda se apagou
na fronte da moça amada.
O tempo está no teu peito
clamando nas coronárias,
mas se esconde nas funduras
dos neurônios quando sonhas.
Está no fogo e no orvalho,
fermenta o pão que não chega,
arde o forno da esperança.
Alma do tempo é a mudança
que come o que vai mudando
e depois dorme sonhando
disfarçado de memória.
Nada perdura na vida,
a não ser o próprio tempo,
finge que passa, mas fica.
Imutável, modifica.
O tempo é o sol do milagre.
Cuidado, ele está chegando
na claridão da manhã.
A noite inteira ficou
no seu passo, te esperando,
de espreita em teu próprio sono.
Vem vindo para comer
na palma da tua mão.
Trata bem dele, aproveita,
enquanto há tempo, o que o tempo
permite ao teu coração.
Quem sabe ele vem trazendo
um alfange? Ninguém sabe.
Pode ser uma canção.
©Thiago de Mello, Poemas Preferidos
pelo autor e seus leitores, 2001 (Do Livro: Campo de Milagres,1998) Editora Bertrand Brasil Ltda
Rio de Janeiro - RJ - Brasil.