[Ah, esse desejo sufocado...]
Duas horas dessa madrugada morna...
Aquela égua pasta tranquila do lado de lá;
e de cá, o cavalo solitário abre as narinas,
fareja o ar do ambiente... deseja a fêmea alheia!
Irrequieto, tem ânsia de varar impossibilidades;
os seus olhos cúpidos lambem aquele corpo...
Ah, romper entre mesas, copos, garrafas,
e num lance audaz, arrebatar aquele corpo,
acertar um duro coice, e galopar para a noite!
Contra mim, este vento assim atroz
traz-me mais forte ainda o cheiro dela!
Mas apenas olhar-me de soslaio não basta;
preciso mais alguma decisão nesse olhar!
Ponho-me à espera... contenho o meu ímpeto.
Atormenta-me a maquinaria infernal
das intensas cerebrações do desejo!
A noite avança... Agora, se ela me der
um tema de entrada, mais um trisco de olhar,
o meu cérebro fatigado, doentio,
fará explodir o meu ser devasso:
não haverá cerca para me conter,
afinal, cavalo à solta na noite eu sou!
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Revisitações da minha coletânea "Cavalos da Noite" - ilustrada por Paula Baggio