Arvore irmã que bem cravada
por ganchos escuros ao solo
a clara fronte levantaste
numa sede intensa de céu.
Faz-me piedoso para a escória
de cujos limos me mantenho
sem que se adormeça a memória
do país azul de onde venho.
Tu que anuncia ao viandante
a graça de tua presença
com ampla sobra refrescante
e com o nimbo de tua essência;
faze com que a minha presença
revele, nos prados da vida,
dúlcida e cálida influência
por sobre as almas exercida.
Árvore criadora dez vezes:
a que tem fruto cor-de-rosa,
a de madeira construtora,
a de zéfiro perfumada,
a de folhagem protetora,
a de bálsamos suavizantes
e a de resinas milagrosas
repleta de pesados ramos
e de gargantas melodiosas;
torna-me doador opulento,
faze-me como tu fecundo:
O coração e o pensamento
me sejam vastos como o mundo.
E todas as atividades
não cheguem nunca a fatigar-me;
as magnas prodigalidades
surjam em mim sem esgotar-me.
Árvore, em que é tão sossegada
a pulsação do existir,
e vês meu alento a agitada
febre do mundo consumir;
faze-me sereno, sereno,
dessa viril serenidade
que deu aos mármores helenos
o seu sopro de divindade.
Tu que não és outra coisa
que doce entranha de mulher,
pois cada rama guarda airosa
em cada leve ninho um ser,
dá-me ramagem vasta e densa,
tanto quanto hão de precisar
os que no bosque humano imenso
não tenham lenha para o lar.
Árvore que onde se levante
teu corpo cheio de vigor
assumes invariavelmente
o mesmo gesto protetor;
faze que ao longo dos estágios
da vida, do prazer, da dor,
minha alma assuma um invariado
e universal gesto de amor.
Gabriela Mistral, poetisa chilena, Prêmio Nobel de Literatura.